quarta-feira, 30 de abril de 2025

Calma Urgente! - Sinofolia. China e a Nova Guerra Cultural

O que comentei aqui no dia 16/4, que a China desenvolveu o seu modelo de capitalismo comunista e que precisamos conhecê-lo, continua sendo objeto de interesse dos principais podcasts. Este talvez seja o melhor que ouvi. Não sou nenhum visionário, apenas vejo o óbvio, que a esquerda brasileira (mundial?) prefere ignorar, porque parou em Lênin, o que me possibilitou criticar Lula, em vez de endeusá-lo. Enfim, essa verdade fundamental do século XXI está emergindo agora com a confusão provocada pelo presidente americano. Nós, brasileiros, achamos que somos europeus e queremos ser ianques, ignoramos as civilizações indígenas que viviam aqui quando os portugueses chegaram para pilhar estas terras, condição que não mudou até hoje, a destruição do Cerrado e da Amazônia pelo agrotoxiconegócio é só uma espécie de atualização da destruição da Mata Atlântica pelos colonizadores. Porque não temos identidade própria e copiamos outros povos, não conseguimos entender a civilização chinesa, milinar, para a qual a atual fase capitalista comunista é só uma nova era. Como será esse novo predomínio mundial chinês?

segunda-feira, 28 de abril de 2025

O melhor programa do YouTube

Sobre urbanismo e arquitetura -- há outros que discutem política e nos informam sobre questões humanas fundamentais, como Calma! Urgente, A Hora, Foro de Teresina e outros. São Paulo nas Alturas, porém, que apesar do nome, viaja pelo Brasil e já veio a BH, é mais amplo, é sobre a vida contemporânea, abrange o principal, como vivemos nas cidades no mundo contemporâneo, e interferir nisso é mudar a nossa própria vida. São escolhas políticas e passam pelo povo, que pode decidir, nas eleições, e pode escolher sabiamente, pois são escolhas que lhe dizem respeito e qualquer um percebe o que é melhor. Há muito tempo não via uma iniciativa como essa, um projeto patrocinado por uma entidade com um objetivo público. Mostra que boas iniciativas são possíveis -- e existem, muitas. Fico pensando que o que falta para a espécie humana se salvar -- e vai ser assim, com iniciativas locais, a partir das escolhas dos indivíduos, coletivamente, que podem ser copiadas mundo afora -- é as pessoas boas se unirem, juntando o que cada um e cada uma sabem e fazem para tornar a vida boa. Esse primeiro programa da série pergunta se Curitiba é a melhor capital do Brasil. Me parece evidente que sim, por um motivo muito simples, citado logo no começo: teve um prefeito sensato, nos anos 70, que planejou o crescimento da cidade com propostas razoáveis, que qualquer prefeito pode seguir, se pensar na coletividade, não nos interesses particulares dos capitalistas que dominam os governos brasileiros em geral.  Belo Horizonte mesmo tem todas as condições para ter um transporte coletivo de qualidade como Curitiba, mas em vez disso fez o monstrengo do Move, falso metrô (Curitiba não tem metrô) horroroso e ainda os carros e motos lotando as ruas, ou seja, retrocedeu terrivelmente nas últimas décadas. 

 

Não atenda ligações no celular, é robô e vai prejudicá-lo

Ninguém deve atender ligações de números não identificados no celular. São ligações feitas por robô e o objetivo é enganar e cometer um crime. A mesma tecnologia que cria o crime é capaz de impedi-lo, mas não o faz, as autoridades tentam resolver o problema mas ainda são incapazes, e os prejuízos são permanentes. Isso tudo é óbvio, mas tem gente que atende.

 

quarta-feira, 23 de abril de 2025

Papa Francisco cortou luxos e abriu Vaticano para sem-tetos

Mais informações e análises, outros pontos de vista. Até o papa foi mais reformador do que o Lula. Francisco nomeou 108 dos 135 eleitores no próximo conclave, de 71 nacionalidades, a maioria deles conservadores, mas os conservadores são mais unidos.

'O novo papa será italiano e progressista', prevê Frei Betto

A análise do Frei Betto completa a conversa do Calma! Urgente e tem discordâncias importantes, ditas por quem é da Igreja e conheceu Francisco de perto. O título no YouTube está errando, o correto é este que aparece aqui: "um corpo conservador e uma cabeça progressista".

A morte do papa Francisco e o futuro

Estou em dúvida, talvez seja esse o melhor podcast semanal.

terça-feira, 22 de abril de 2025

Comemos alimentos envenenados e fingimos não saber

Assim como a destruição ambiental, que conhecemos desde os anos 70 pelo menos, mas fingimos que não é com a gente. É. Todos destruímos o ambiente, como nossos hábitos de consumo, e contribuímos para que o capitalismo continue sua obra de destruição. Achamos que o problema é tão grande que não podemos fazer nada. Ou fazemos algumas coisas que não mudam o quadro, porque a mudança precisa ser radical. Achamos que isso é responsabilidade dos governos e das empresas, mas empresas querem ganhar dinheiro, não vão mudar suas práticas para conter e reparar a destruição ambiental, e governos são eleitos com dinheiro das empresas, não vão contrariá-las. Para impedir a catástrofe ambiental, para que continue a existir mundo para nossos filhos e netos, somos nós, as pessoas comuns, que temos de agir. Cada um tem que tomar a decisão determinada de mudar seu estilo de vida e abolir práticas que destroem o ambiente. Simples assim. Quando fizermos isso, estaremos influenciando políticos e empresas. Outra coisa é ilusão. Gostamos muito de nos iludirmos.  

 

sábado, 19 de abril de 2025

O que você precisa saber sobre a China, segundo Toledo e Haddad

O que eu cobrei há alguns dias, está sendo motivo de atenção não só do jornalista José Roberto de Toledo, mas também do ministro Fernando Haddad, o que mostra que estou pensando bem, sobre o óbvio: precisamos conhecer a China, o que está acontecendo lá e o que aconteceu para que esse país comunista e capitalista (!) não repetisse o fracasso da União Soviética. Uma das coisas que a China fez diferente da Rússia foi não aderir às soluções neoliberais do FMI. Este programa dá algumas dicas e ainda uma bibliografia para quem quiser saber mais.

sexta-feira, 18 de abril de 2025

Agrotoxiconegócio destrói o ambiente e não produz alimentos suficientes

Da excelente Repórter Brasil.

‘Comida mais cara tem a ver com a falta de reforma agrária’, diz pesquisadora

Para Yamila Goldfarb, presidenta da Associação Brasileira de Reforma Agrária, combater a concentração de terras ainda é ferramenta para reduzir a fome, diminuir a injustiça social, fazer reparações à população negra e mitigar a crise climática. 
 
Por Igor Ojeda, 17/4/2025  

A ALTA DOS PREÇOS dos alimentos observada nos últimos meses no Brasil tem como um dos fatores a falta de uma política consistente de reforma agrária. A avaliação é de Yamila Goldfarb, presidenta da Abra (Associação Brasileira de Reforma Agrária). 

“Há um déficit de oferta de alimentos que seria suprido pela reforma agrária, com mais famílias tendo acesso à terra e, portanto, podendo produzir alimento”, explica, em entrevista à Repórter Brasil

Segundo Yamila, a oferta de alimentos deve ser uma das medidas de combate à fome. Mas, ao contrário do que propaga, o agronegócio não supre o mercado interno, além de ser responsável por danos ambientais e conflitos no campo. 

Doutora em ciências humanas pela USP, Yamila Goldfarb preside a Associação Brasileira de Reforma Agrária (Foto: Arquivo Pessoal)
Doutora em ciências humanas pela USP, Yamila Goldfarb preside a Associação Brasileira de Reforma Agrária (Foto: Arquivo Pessoal)

“O agronegócio implementou uma estratégia política e midiática de se fazer valer como sendo tudo e todos: ‘É o motor da economia brasileira, representa o campo brasileiro.’ E essas duas afirmações são mentiras”, afirma.

Doutora em ciências humanas pela USP (Universidade de São Paulo), Yamila argumenta que a modernização do campo a partir da década de 1990 abriu margem para o discurso de que a reforma agrária não é mais necessária, ideia que considera um equívoco. “Não somente a reforma agrária sempre se manteve atual, como ela ganha uma nova importância hoje frente à questão climática”, reflete.

A entrevista é publicada por ocasião do Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária, celebrado em 17 de abril. Instituída em 2002, a data marca o Massacre de Eldorado dos Carajás, no Pará, quando, nesse mesmo dia de 1996, 21 trabalhadores rurais sem-terra foram assassinados pela polícia. 

Na entrevista, a presidenta da Abra analisa também a relação do agronegócio com a extrema direita, as dificuldades encontradas pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva para implementar a reforma agrária e a importância dessa política como medida de reparação para a população negra.

Leia a íntegra clicando aqui.

Tom Jobim, a imprensa e a verdade

Esse trecho da entrevista é importante, porque o interrompem menos. 

"O Brasil não é para principiantes" (Tom Jobim)

Hoje é sexta-feira 18 de abril, segunda-feira é feriado e por conta disso a feirinha aqui da esquina não funcionou. Eu não entendi por que e lembrei da frase do Tom Jobim: "O Brasil não é para principiantes". Ouvir o Tom falando sempre é ótimo, quando os entrevistadores deixam e não o interrompem, com sua ignorância, vontade de aparecer mais que o entrevistado e perguntas fúteis. Essa prática, generalizada, me incomodava, até entender que a função dos entrevistadores na televisão é realmente atrapalhar, para que nada importante seja dito, porque televisão não é para isso, televisão é show. Há exceções, e acho até que vem melhorando, talvez por influência da internet. A gente tem que pular, ouvir só o entrevistado, e aí consegue escutar o Tom explicar a história da sua frase famosa, a exata inclusive. 

PS: Desligado do mundo e da religião, não me dei conta de que hoje é feriado cristão, Sexta-feira da Paixão. O comércio todo tá fechado. Feriadão daqueles, quatro dias.

quarta-feira, 16 de abril de 2025

Capitalismo sem-vergonha

Há muito tempo não via um programa com tantas verdades sobre o mundo contemporâneo e de uma forma amarrada, ligando áreas distintas, como a vida privada, a política, a economia, a arte, enfim, a ideologia da nossa época, como esse Calma urgente! Sem-vergonhismo. Aplausos prolongados para Gregório Duvivier, Alessandra Orofino e Bruno Torturra. Eles discutem sobre esses estranhos tempos em que os mais ricos e poderosos não têm vergonha de roubar, manipular e enganar, inclusive seus "seguidores", isto é, seus fãs, seus eleitores, seus consumidores. O que escrevo aqui não é exatamente o que diz o trio do programa, mas o que penso a partir do que eles dizem, inclusive comentários críticos.

O ponto fundamental é que o capitalismo não mudou, continua o mesmo na sua essência, o que mudou, o que muda sempre é só a ideologia. A ideologia pela qual o capital se expressa nas mentes de alguns, os ideólogos do capital, e escraviza a todos nós, humanos, como seus servidores, capitalistas e trabalhadores. 

A nova direita, também chamada de extrema direita e de fascista, adotou o método que está sendo um sucesso, comercial e eleitoral, o que dá no mesmo. A esquerda brasileira, no poder, misturou o sucesso político e eleitoral com a corrupção; a corrupção fazia parte do sucesso político, do poder, o preço a pagar para, e deixou de ser uma alternativa ao sistema capitalista sem-vergonha. Isso continua e está mais desavergonhado nesse terceiro governo Lula. 

No fim, tudo é capitalismo, de direita ou de esquerda. Não penso que a extrema direita seja pior do que a esquerda capitalista ou o centro capitalista, está aí o "Centrão" para provar, na política brasileira. São diferentes e a sem-vergonhice assusta alguns, os crimes assumidos nos aterrorizam, sejam as mais 700 mil mortes por covid-19, sejam os extermínios de indígenas e de palestinos, seja a matança diária de jovens pretos, seja a devastação de ambientes inteiros por rompimentos de barragens de minérios, seja a derrubada de vastas extensões de floresta etc. 

Aliás, a política brasileira atual é um contraponto interessante à política americana atual e à política brasileira do governo anterior. Na prática, qual a diferença entre elas? São variações do mesmo, sendo as duas últimas versões desavergonhadas, enquanto o governo Lula 3 equilibrando-se entre o Congresso desavergonhado e o STF moralizador, finge oferecer uma alternativa a isso, mas, na prática, oferece? O que o ex-ministro Sílvio Almeida teria a dizer sobre isso? 

A chamada nova extrema direita fascista é só o que o Homo sapiens, o Homo capitalista, a velha direita, o centro, a dita esquerda são mas têm vergonha de ser. Chegamos a esse ponto do capitalismo em que as catástrofes ambientais, também conhecidas por mudanças climáticas, não podem ser negadas, mas não são enfrentadas, porque enfrentá-las é mudar o sistema e isso ninguém tem coragem de fazer, nem esquerda nem centro nem direita. A diferença é que a extrema direita não tem vergonha de afirmar que está destruindo mesmo e que destruir é bom e vai continuar destruindo e quer destruir cada vez mais e que todo mundo deve destruir. O governo Lula, por exemplo, que ainda tem alguma vergonha, mantém a destruição, mas diz não tem força política para contê-la. A pergunta inevitável é: para um governo de esquerda, se vai praticar a mesma política da extrema direita?

A extrema direita é a expressão da barbárie em que vivemos e para a qual todos contribuímos, seja como capitalistas seja como trabalhadores, seja como proprietários das riquezas, seja como produtores assalariados das riquezas, porque somos todos consumidores: os capitalistas, consumidores das riquezas que nós produzimos e nós, todos os outros, consumidores das sobras e da ideologia que nos convence a consumi-las. O capitalismo continua porque queremos que continue, apesar dos discursos em contrário.

A esquerda no poder não é de fato esquerda. Finge ser. A esquerda no poder torna-se uma variante do poder burguês, um outro time de administradores dos negócios do capital, para repetir a expressão do Marx no Manifesto Comunista. A esquerda no poder não é esquerda, se a gente considera o que caracteriza a esquerda, ou seja, a intenção de superar o capitalismo e substituí-lo por outro sistema. Nos tempos atuais, tudo isso ficou esquecido, o capitalismo perdeu totalmente a vergonha de ser o que é, de mostrar o que é, de afirmar que é o que é, e a nova direita é a expressão política disso e tem muito sucesso, porque está no seu próprio ambiente, no qual a referida esquerda tenta entrar. A formulação da alternativa a tudo isso, seus porta-vozes e modelos existem, mas não aparecem tanto quanto o modelo hegemônico, sustentado, afinal, pelo capital, o senhor do mundo. 

Me impressiona como pessoas brilhantes, cultas, inteligentes vejam tudo, conheçam tudo e cheguem só à conclusão de que tudo isso é "extremamente problemático". É um começo. O que fazer com isso, ou seja, o que queremos no lugar disso e como fazer para chegar ao que queremos não está mais no horizonte da esquerda. Não falo de utopia, falo de propostas concretas que a esquerda não ousa ter. 

Qual é a alternativa ao capitalismo? Alternativa prática, com propostas concretas para "o público". Penso que essa alternativa não existe porque o marxismo, ou marx-leninismo e outras variantes esgotaram as perspectivas da esquerda, com a experiência russa e o desmoronamento do bloco soviético. Não existe um marxismo do século XXI -- e o stalinismo foi o marxismo do século XX. Todos os intelectuais que têm coragem hoje de se dizerem marxistas não dão um passo para atualizar o marxismo, tudo que fazem é louvar Marx, dizer como ele é genial, tentar aplicar o que ele disse há duzentos anos ao mundo contemporâneo que é completamente diferente. 

Nenhuma das previsões do profeta Marx se realizou, embora seu retrato do capitalismo tenha sido o melhor e definitivo. O Capital, hoje, é só um livro base, um ponto de partida para a formulação de uma alternativa de esquerda ao capitalismo, seja qual for o seu nome, comunismo, socialismo, social-democracia, democracia dos trabalhadores, anarquia. A China comunista desenvolveu seu modelo capitalista de Estado, que não é comunista, apenas não é esse capitalismo sem-vergonha, mas provavelmente tem suas características, mas a gente pouco sabe dele, porque a esquerda não tem coragem de discuti-lo, talvez para não expor a fragilidade do seu marxismo. Me parece incrível que a esquerda que se diz marxista ignore uma nação que cresce de forma espetacular e está prestes a se tornar a maior potência capitalista mundial e se diz comunista.

É impossível não comentar, porque, ao fazer certas afirmações ("extremamente problemático", "a publicidade tem pessoas brilhantes"), os analistas não veem o óbvio. É claro que a publicidade suga mentes brilhantes, porque senão ela não faria comerciais eficientes. A publicidade, como expressão institucional do capital, faz o que tem de fazer: compra trabalhadores. E os indivíduos mostram o que são. O capital, uma coisa imaterial, que não existe de verdade ("é só dinheiro"), só pode exercer seu poder dominando os humanos; se os humanos disserem não a ele, se forem capazes de adotar uma ideologia anticapitalista, não capitalista, o capital desaparece como num passe de mágica. São os humanos, com suas ideologias, capazes até de transformar Jesus Cristo crucificado pelos poderosos dois mil anos atrás num avalista da prosperidade, que encarnam o capital e lhe possibilitam exercer seu poder. 

Não vou dizer que publicitários são geniais nem criadores de verdadeiras obras de arte, embora pudesse dizer que são, porque de fato não são, mas parecem ser, e quase são, chegam a exercer a mesma função no público, mas não são simplesmente pelo fato de que mentem sempre para vender, enquanto a arte é o oposto disso, nos mostra a verdade. A publicidade captura a arte para fingir, enganar e vender. O indivíduo "brilhante" ou "genial" que troca a arte pela publicidade prefere ser um publicitário rico do que um artista pobre, justifica-se dizendo "eu tenho que sobreviver, entende?", para citar o melhor Pasquim, dos anos 70, pra gente ver como isso não é novo e já na ditadura tinha gente se vendendo. De fato, esse "modelo de negócio" baseado na publicidade é parte do capitalismo americano do pós-guerra, do consumismo, que é explicado de forma brilhante e genial no vídeo A história das coisas. Quem na minha geração não se lembra do seriado A feiticeira, cujo marido é um publicitário, seriado que, por sua vez, é exemplo do modelo televisão, negócio fingindo ser arte para vender sabão em pó?

"A nossa enorme economia produtiva exige que façamos do consumo nossa forma de vida, que transformemos a compra e uso de bens em rituais, que procuremos a nossa satisfação espiritual, a satisfação do nosso ego, no consumo. Precisamos que as coisas sejam consumidas, destruídas, substituídas e descartadas a um ritmo cada vez maior." (Victor Lebow, teórico do consumismo que passou a vigorar nos EUA e no mundo a partir do fim da 2ª Guerra Mundial, citado em A história das coisas.) 

Uma coisa puxa outra e vai dar no que o mundo é hoje. No século XX, o capitalismo entrou em colapso, com a Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a Revolução Russa de 1917, a ascensão do fasci-nazismo (1911-1945), a Grande Depressão de 1929 e a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Hoje, as pessoas razoáveis ficam estarrecidas com o genocídio na Palestina e chocadas com o projeto do presidente americano de transformar a região, depois de exterminado o último palestino, num resort fantástico, e é possível que consiga, já que as resistências parecem fracas, mas não há nada de extraordinário nisso, a não ser a nossa -- das pessoas razoáveis, boas, de esquerda -- aparente infinita incapacidade de compreender a realidade, a história e o comportamento humano. Os acontecimentos do século XX citados acima produziram horrores que, se houvesse uma força superior para julgá-los, teriam condenado ao extermínio da espécie humana da face da Terra. A Segunda Guerra Mundial terminou com os EUA, "a pátria da liberdade", despejando duas bombas atômicas sobre a população civil japonesa. Foi talvez o maior crime da ideologia capitalista no século, mas não o primeiro nem o último -- não vou falar dos outros acontecimentos nem dos que vieram depois e continuam ainda hoje.

O projeto do presidente americano é a história do capitalismo, exterminar um povo para explorar a sua terra. Por que não me soa estranho? Por que não me parece novidade? O que foi que os europeus fizeram neste continente desde sua chegada no fim do século XV? O que é que o agrotoxiconegócio faz na Amazônia ainda hoje, senão exterminar os povos originários para explorá-la comercialmente e enriquecer, derrubando a floresta e transformando-a em pasto e solo de plantio de monoculturas? O que foi que os próprios colonizadores europeus fizeram naquelas terras para fundar os EUA, a nação sem nome, senão exterminar os povos indígenas?

Isso é o capitalismo na sua essência, passando por todas as suas variantes, envergonhadas ou desavergonhadas. O único objetivo é o lucro, é a produção de riqueza para obtenção de lucro. O capital é como um câncer, que só existe crescendo sempre e destruindo. Faz isso encarnado nos humanos que o criaram e por meio de nós consome a Natureza. Qual é a alternativa a ele? Apresentá-la, conquistar as mentes e implantá-la é o papel da esquerda para tentar ainda salvar a espécie, a civilização, a vida na Terra. 

Conclusão que eu tiro do brilhante programa, um dos melhores dos que já vi: a esquerda é igual a Marx, excelente em fazer diagnósticos, mas não tem uma proposta alternativa melhor (considerando que nem a URSS nem a China comunista, esta até prova em contrário, se mostraram melhores) ao capitalismo.

 

terça-feira, 15 de abril de 2025

Rotina para dormir bem

Muito bom. Ver o nascer do sol e o pôr do sol. Acho que é a primeira vez que tenho essa vontade. Os vídeos desse médico são muito interessantes, práticos e úteis. E ele parece confiável.

sábado, 12 de abril de 2025

Françoise Hardy, Le premier bonheur du jour (Official Lyrics Video)

Outra pérola que Françoise Hardy nos deixou. 

A capital e o capital: o homem, Brasília, Tom, Vinicius, JK, história

Dentro de nove dias, Brasília completa 65 anos. Pela lei brasileira, pode se aposentar. 21 de abril de 1960, data da inauguração, celebrada numa sinfonia por Tom e Vinicius. 

Foi quando tudo começou. Em clima de ufanismo, pelas mãos, ou melhor, pela cabeça e pela vontade determinada do mais querido presidente do Brasil, uma unanimidade nacional, cuja vida trágica exemplar é um retrato da trajetória dos brasileiros nos últimos cem anos. Presidente do melhor quinquênio da nossa história, ajudou a eleger no Congresso o primeiro presidente ditador militar, como líder do seu partido, o de maior bancada na época, confiando na promessa de eleições diretas no ano seguinte, quando voltaria pelo voto popular, para completar sua obra gloriosa, mas foi traído e cassado, passou o resto da vida no ostracismo e morreu num atentado tramado pelos terroristas de direita, versão que não se pode mais rejeitar. 

(Leio na Wikipédia que Brasília tem um lema: "Aos ventos que hão de vir". Nada mais adequado; os ventos vieram, soprando forte da Floresta Amazônica, varrendo o Planalto Central, o Sertão e chegando ao litoral, de onde partiu o homem, não qualquer homem, o Homo sapiens capitalista, que atravessou o Atlântico vindo da Europa e começou a devastar o continente. Outro homem, habitando a floresta e convivendo sabiamente com a Natureza, já vivia aqui. Foi e continua a ser dizimado, extinto como as outras espécies que o Hs não reconhece como tendo direito à vida e parte do planeta que ele considera seu, propriedade e mercadoria, simples fonte da matéria-prima para produção de riquezas. O Homo contemporâneo nunca foi sapiens, mas talvez possa ser adequadamente chamado de Homo trumpis, sua mais perfeita tradução.) 

Brasília: Sinfonia da Alvorada, o poema sinfônico de Tom e Vinicius, acabou se tornando um projeto não concretizado, mas cumpre o papel da arte de retratar ideologicamente um povo, uma época, um lugar. Idealizada pelo arquiteto Oscar Niemeyer, cujos prédios monumentais estão lá testemunhando aquela época grandiosa, embora tenhamos nos acostumado de tal forma que nem damos mais valor e até pichamos esculturas, numa demonstração de que não reconhecemos a cidade como nossa (de fato, tornou-se a cidade das castas privilegiadas do país), a sinfonia deveria ser apresentada pela primeira vez nas solenidades de inauguração da nova capital, mas isso não aconteceu. Só veio a ser executada de fato depois que a ditadura militar acabou. 

Parodiando JK, Brasília tornou-se a tragédia síntese do Brasil. Abriu o caminho para a devastação do Cerrado, do Pantanal e da Amazônia. Com o melhor dos propósitos, como atesta o poema sinfônico do Vinicius e do Tom. A música expressa a grandiosidade da Natureza que o Homem encarava -- e sempre é bom lembrar que uma árvore gigantesca matou, ao tombar, o engenheiro que liderava a construção da rodovia Balém-Brasília, outro símbolo inaugural da devastação que então de chamava de desbravamento. A questão é simples: o capitalismo "desbrava", para gerar lucro, para produzir riquezas e o rastro desse desbravamento, o outro lado da moeda, é a destruição, no caso, dos biomas milenares e suas populações, para os quais o capital não dá a menor bola. O capital não tem subjetividade, só objetividades. Enquanto o Homem for seu escravo, fazendo o que "o mercado" manda, será assim, riqueza criada com destruição e que só vai terminar no dia que as mudanças climáticas eliminarem as condições da existência humana (e de inúmeras outras espécies extintas antes) na Terra. Simples assim. 

No glorioso quinquênio JK, quando o Brasil cresceu 50 anos em 5, tudo aquilo parecia maravilhoso. O desafio era o Homem conseguir "vencer a floresta" inexpugnável durante mais de quatro séculos. O Brasil ainda era uma nação imensa cuja população estava concentrada no litoral do Leste, deixando a Natureza em paz no restante do seu território. JK, um mineiro, diamantinense, conhecia a devastação que o "desenvolvimento" provoca enquanto cria riquezas, porque foi isso que ele fez nestas montanhas, em Diamantina, Ouro Preto e todas as "cidades históricas", e faz ainda, com os rompimentos de barragens. Com seu plano, JK invadiu o Sertão e começou a marcha para Oeste. Deu aquele salto na industrialização no país e tudo mais. Enquanto ele construía Brasília, os artistas criavam como nunca antes nem depois a Bossa Nova e o Cinema Novo, além do futebol arte, que conquistou enfim a primeira Copa do Mundo. Confirmava-se, naquele pós-guerra de recuperação mundial, que o Brasil era "o país do futuro" previsto pelo escritor austríaco exilado Stefan Zweig. 

Depois da bonança do glorioso quinquênio JK, sobreveio porém uma sucessão de desgraças: a eleição de Jânio, sua renúncia, a tentativa de golpe contra a posse de Jango, o desastroso governo Jango, o golpe vitorioso do dia da mentira, uma ditadura militar de 21 anos. 

Note-se: a história não se explica pela economia, simplesmente e principalmente. O plano de JK foi só a iniciativa mais eficiente de um projeto nacionalista elaborado a partir da Revolução de 1930, que previa modernização, industrialização, urbanização, atração de capitais estrangeiros, uso de capital estatal para apoiar a iniciativa privada com obras de infraestrutura (o que foi Brasília, senão uma imensa e complexa obra de infraestrutura?). Um projeto em que o capital até então agrário e concentrado no litoral se expandiria para as cidades e para o interior, rumo à Amazônia, para transformá-la e tudo no seu caminho num gigantesco pasto e terreiro de monoculturas. Getúlio começou a fazer isso, Dutra continuou e JK deu-lhe um impulso monumental, mas a ditadura não o interrompeu, ao contrário, prosseguiu o "desenvolvimentismo" nacionalista. Nunca se criaram tantas estatais, as "brás", quanto na ditadura militar. Esse projeto só acabou com a democratização, a partir de 1985, e foi substituído pela "modernização" do neoliberalismo inaugurada por Collor, que -- ironia -- evocou JK, e seguida por Itamar, FHC, Lula e Dilma. Os que vieram depois do golpe parlamentar de 2016 só fizeram administrar o desmoronamento da economia nacional iniciado décadas antes. A bem da verdade, é preciso dizer que, embora pelo método confuso, sem um plano como JK, Getúlio ou os governos militares, Lula tentou ressuscitar o desenvolvimentismo, como o seu Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). 

A tragédia brasileira é que não continuamos de forma persistente o único projeto de desenvolvimento nacional que tivemos, como fizeram as nações que cresceram nos séculos XX e XXI, como China e outras nações asiáticas, e ao mesmo tempo procedemos a todas as ações nefastas contra a Natureza que o desenvolvimento capitalista realiza. Somos a nação que mais destrói a Natureza irresponsavelmente em troco de nada, só para benefício de uma casta capitalista riquíssima, egocêntrica, reacionária, estúpida e antidemocrática, sem qualquer benefício para 99,99% dos brasileiros, exceto as demais castas privilegiadas que sustentam essa ordem. Onde? Em Brasília, naquela cidade modernista, que foi o maior testemunho do gênio brasileiro durante cinco anos. 

JK foi modesto: seus cinco anos já representam mais de cinquenta e pelo visto se tornarão cem, pois não há no belo horizonte planaltino sinal de que os ventos substituirão a destruição em curso por um ambiente melhor. A única voz lúcida entre os políticos brasileiros (reza a lenda que, no segundo mandato que não houve, 1965-1970, JK corrigiria os erros que já antevia no seu plano de desenvolvimento), Ciro Gomes, propõe um desenvolvimentismo reciclado, que tem méritos evidentes diante do caos vigente, por tentar reorganizar a nação, mas ignora que aquele tempo passou, exatamente pelos seus efeitos desastrosos para o ambiente, e que um plano atual, para o Brasil e para o mundo, precisa partir do decrescimento econômico, da distribuição das riquezas e da recuperação da Natureza, para que a espécie humana sobreviva, numa vida em harmonia com as demais especiais, como nos ensinam há séculos os habitantes primitivos destas terras e que nunca se consideraram seus proprietários. 

Música do dia: O Homem (Man), Tom Jobim

Nessa melodia vejo perfeitamente o Homo sapiens capitalista derrubando e queimando a floresta para criar gado, plantar soja, explorar minérios e exportar madeira clandestinamente. 

domingo, 6 de abril de 2025

Cidadão Boilesen, de Chaim Litewski, filme completo

O documentário citado na entrevista sobre o livro A serviço da repressão, de 2009.

Livro mostra participação da Folha de S.Paulo no golpe de 64 e na ditadura

A serviço da repressão: Grupo Folha e violação de direitos na ditadura, livro escrito por uma equipe de pesquisadores acadêmicos para subsidiar ação do Ministério Público Federal, mostra como os donos do da Folha de S. Paulo participaram das preparações do golpe militar de 1964 e como a empresa colaborou com o aparelho repressivo da ditadura, inclusive dentro do jornal contra seus próprios jornalistas e demais funcionários. Não é exatamente novidade: a Comissão Nacional da Verdade atestou isso, conforme reportagem da Carta Capital de dezembro de 2014. De mais a mais, a participação da Folha na ditadura era amplamente conhecida, exceto pelos incautos. Inexpressivo, o jornal deu uma guinada editorial e apoiou a campanha Diretas Já, declarando-se desde então como diário pluralista, fez mais ou menos o mesmo que Sarney e seus colegas da dissidência do PDS que virou PFL. O livro conta em detalhes, inclusive com depoimentos de integrantes da repressão, como se deu a colaboração da Folha, como diz a entrevistada, muito maior e pior do que a da Globo, e nesse sentido é um livro definitivo. A ação do MPF está responsabilizando empresas, a Folha entre elas, por colaborarem com a repressão. 

  

sábado, 5 de abril de 2025

Música do dia: Desculpe o auê, Rita Lee

Não sou fã da Rita Lee depois dos Mutantes, gosto de uma coisa ou outra, sobretudo do show inesquecível que vi dela com Gilberto Gil no Ibirapuera em 199 ou 2000, na melhor companhia. Esta canção é exceção, uma pérola, um John Lennon pós-Beatles. As comparações param aí, porque não existem propriamente Mutantes pós-Mutantes, só Rita Lee, que seria Paul, e Paul não fez muita coisa depois, só pérolas pontuais também; não há John Lennon nos Mutantes pós-Mutantes. Desculpe o auê é a Jealous Guy da Rita Lee, seu momento John Lennon pós-Mutantes, sem o mesmo fôlego, mas a mesma graça. Se ela tivesse cantado isso para mim naquela época, talvez ainda estivéssemos juntos cercados de filhos ou eu tivesse morrido Roberto do lado da minha Rita. Feliz aniversário.

 

sexta-feira, 4 de abril de 2025

Trailer do documentário Pau D'Arco

Você teria coragem de depor contra a polícia?, pergunta a Repórter Brasil ao divulgar o documentário Pau D'Arco. A Amazônia é o faroeste brasileiro, manda a força, que faz justiça pelas próprias mãos, formando exércitos de jagunços, inclusive policiais militares, e compra autoridades. E qual é a força? O capital, pelas mãos dos seus escravocratas capitalistas, que destrói a floresta e extingue espécies, inclusive humanas, para criar gado e plantar soja para exportação, para promover o "progresso", nome socialmente aceitável do lucro abundante e crescente que a destruição do ambiente gera. E assim caminhamos todos juntos para a catástrofe das mudanças climáticas e do fim da civilização.  

 

Música do dia: Luz negra

Ninguém melhor do que Cazuza para interpretar essa canção do Nelson Cavaquinho.

quarta-feira, 2 de abril de 2025

O Japão "estagnado", segundo a BBC News Brasil

Fiquei estupefato com essa reportagem absurda da BBC News Brasil, que tanto elogio. Depois de listar supostos problemas da economia do Japão e afirmar que ela está "estagnada", a repórter diz que, "apesar de tudo isso, não tem nenhum protesto nas ruas". "Parece que vai tudo bem": a criminalidade é muito baixa, a expectativa de vida é muito alta, a inflação é mínima, o desemprego também, a educação é excelente, a saúde também. Ou seja, qualidades viraram defeitos, que impedem a população de reagir. Uma inversão completa. 

Um "defeito" dos japoneses que torna ineficazes medidas econômica governamentais é que eles preferem poupar e se prepararem para o futuro a consumir freneticamente e se endividar, como os americanos e povos que seguem seu modelo. No Brasil mesmo isso aconteceu nas duas décadas do Plano Real e do governo Lula. A ideologia justifica tudo e na época considerava uma maravilha que os pobres tivessem entrado no "mercado de consumo". Como se viu, não durou e hoje o endividamento dos trabalhadores é tão grande que o governo liberou o FGTS para pagamento de empréstimos consignados. Se isso fosse feito por um governo de direita, seria denunciado como um crime contra os trabalhadores, assim como foi a reforma trabalhista de temer e do bozo, mas como foi cometido por um governo "de esquerda" e tolerado pelas centrais e sindicatos dos trabalhadores. Afinal, é para isso mesmo que servem os governos do PT, para tomar medidas a favor do capital e contra os trabalhadores sem que estes reajam. 

Outro suposto problema do Japão é que sua população está diminuindo; foi a primeira nação desenvolvida em que isso aconteceu, o que poderia ser um indicador de que o Japão está na vanguarda. Num mundo em que o consumo crescente e estimulado destrói a Natureza e a população humana cresce aumentando o consumo e a destruição, o decréscimo populacional me parece ser uma boa notícia. Para a matéria, porém é mais um aspecto da situação "complexa" do Japão "estagnado". A produtividade dos trabalhadores japoneses é baixa porque "tem muita gente empregada", se houvesse desemprego, se as empresas trocassem gente por robôs, a produtividade aumentaria, sugere a matéria. Uma espantosa analista britânica diz que no Japão a gente encontra "seis pessoas orientando o trânsito", ou seja, trabalhando, mas isso é desnecessário. Elas poderiam ser demitidas e substituídas por robôs, deduzimos. 

A mesma analista afirma que o governo japonês tenta fazer a economia "pegar no tranco", estimulando o consumo e baixando juros, mas não consegue. A impressão que dá é que a vida no Japão está miserável, para que seja necessário o crescimento que a BBC News Brasil e suas fontes querem, mas não está, o povo está satisfeito, como a própria matéria mostra. O "problema", portanto, não existe para as pessoas, para os trabalhadores, para os japoneses, o problema existe para o capital, porque, para o capital, a economia só vai bem se há crescimento, porque crescimento significa lucro, capital só existe crescendo permanentemente, e quanto mais melhor, para o capital, e para seus escravos de luxo, os capitalistas. 

Esta é a questão e é uma questão ideológica, é assim que o capitalismo funciona. Mesmo os ideólogos marxistas, supostos inimigos do capital, concordam que a economia precisa crescer. O que significa que, na prática, são capitalistas, porque o que promove o crescimento é o capital, sua expansão permanente: dinheiro que não aumenta no fim da sua aplicação não é capital, é só dinheiro, equivalente geral, meio de troca. O crescimento é bom, o desenvolvimento é bom, o progresso é bom, o capital é bom -- essa é a nossa ideologia, a ideologia do sistema capitalista, e todos nós acreditamos nisso, inclusive os marxistas. A diferença é que os marxistas querem que o capital esteja sob controle do Estado. Pois bem, a China está fazendo isso. A China "comunista" é uma nação comunista ou capitalista?

Eu fico imaginando por quantos cursos passou e quantas línguas fala essa repórter evidentemente muito qualificada para dizer uma estupidez assim. Não é ironia, nenhum jornalista trabalha na BBC se não for muito qualificado, e ela efetivamente se qualificou para falar isso, que é uma expressão da ideologia capitalista. Ter uma vida boa (emprego, renda, educação, saúde, segurança, ou seja, os famosos "indicadores") é o que as populações de todas as nações querem, mas se a economia não cresce como crescia, se as fábricas não substituíram gente por robôs, se as empresas não promoveram desemprego em massa, se os computadores ainda usam disquetes e os faxes ainda estão em operação, então o país está atrasado. Até as tampas de bueiros japonesas são questionadas na matéria.

A reportagem poderia mostrar o contrário, como os japoneses estão satisfeitos com sua vida, apesar de o Japão não acompanhar a loucura de "modernização" de outras nações; poderia apontar os "sinais de atraso" e por que eles não prejudicam a qualidade de vida, ao contrário, contribuem para ela. Entretanto, faz o discurso ideológico da modernização como um objetivo em si. A repórter sequer percebe o ridículo que é falar em "parar no tempo" referindo-se a um período de duas décadas para uma civilização milenar. Quem sabe, abordando isso, não poderia fazer matéria muito mais relevante sobre como a cultura japonesa se impõe sobre a ocidentalização e cria até uma alternativa sábia à destruição frenética da vida pelo capitalismo? 

A matéria também não pode afirmar, embora nos deixe depreender isso, que o Japão é um títere americano, que foram os EUA que despejaram capitais para reerguer a nação asiática depois de despejarem bombas atômicas sobre sua população, que significaram o fim da Segunda Guerra Mundial. E que, mais tarde, quando sua economia se tornou a segunda maior do mundo, superada apenas pela americana, a obrigaram a reduzir a competitividade dos seus produtos. A matéria, enfim, não mostra muitos aspectos desse contextos que ajudariam a compreender melhor o Japão. Prefere o apelo sensacionalista, como toda "boa" matéria, para capturar o público, porque a BBC News Brasil faz parte de um "mercado" que disputa telespectadores e busca "sucesso".   

Eu seria ingênuo se pensasse que isso é feito simplesmente porque um jornalista pensou essa pauta e sua chefia aprovou. E seria maniqueísta se dissesse que a matéria foi pautada com um objetivo preciso de atender a determinado interesse. Uma matéria é sempre uma escolha. Minha experiência jornalística me ensinou que no topo das empresas jornalísticas está uma elite intelectual ideológica que orienta o conteúdo produzido. Não é uma ditadura, não tem  censura, talvez não tenham sequer um "manual", como fizeram jornais brasileiros há algumas décadas (imagino que ainda existam). É um modelo de produção que vai moldando os profissionais para seguirem determinada linha, porque tal pauta é "boa", outra é "ruim", e todo jornalista quer fazer uma boa matéria com repercussão. 

O fato é que a matéria afirma que o Japão parou no tempo porque não seguiu a modernização tecnológica com desemprego em massa e baixos salários que o capitalismo impõe no mundo inteiro, e esta é a mensagem. É assim que a ideologia funciona e é assim que a imprensa, até a melhor dela, contribui para formar a mentalidade que leva a espécie humana para a catástrofe.

 

terça-feira, 1 de abril de 2025

Música do dia: Woman, John Lennon

Ou será essa a mais bela canção de amor? Uma pérola, poesia de primeira. "The little child inside the man."