"Os
partidos de centro-esquerda e centro-direita estão em colapso. E por
que não conseguiram resolver os problemas básicos das sociedades
contemporâneas? A base histórica da social-democracia eram os
trabalhadores da antiga vanguarda econômica, que era a indústria. Na
teoria marxista, era essa a classe que falava pelos interesses
universais da humanidade. Mas agora essa classe passou a ser vista como
só mais um grupo falando pelos seus próprios interesses. A
verdadeira minoria representativa dos interesses universais da
humanidade é essa pequena burguesia subjetiva que eu descrevi. Essa
maioria de pessoas pobres e desorganizadas. Então
os partidos liberais (progressistas) não resolvem os problemas porque
não entenderam que a única solução possível é organizar uma forma
socialmente inclusiva desse novo paradigma produzir a economia de
conhecimento, com as capacitações dessa periferia. A
conversa no Brasil é uma variação desse drama universal. Então a grande
maioria no Brasil elegeu o direitista (Bolsonaro) que nomeia para
conduzir a economia o funcionário do mercado financeiro que não faz
absolutamente nada para construir um capitalismo popular. Então a
confusão persiste."
Uma entrevista do Roberto Mangebeira Unger à BBC Brasil. Não é nova, tem mais de um ano, mas como o Brasil está parado, continua atual, como aquele livrinho que ele escreveu há trinta anos. Ele é um tipo esquisito e não faz questão de ser claro, mas quem se dá o trabalho de afastar o preconceito encontra ideias interessantes e até premonitórias, como o livrinho citado confirma. Na verdade, a afirmação do título é óbvia, mas ver o óbvio é o desafio da mente confundida pela ideologia. Para ler a íntegra, clique aqui.
Há trinta anos, Ciro Gomes e Roberto Mangabeira Unger publicaram um livrinho, O próximo passo -- uma alternativa prática ao neoliberalismo.
Muita água passou debaixo da ponte depois, água que parecia boa, água
que parecia melhor ainda, água ruim, água pior ainda, água contaminada,
água que, há trinta anos, nos ventos auspiciosos do Plano Real, não
podíamos imaginar que viria, de forma que nossa vida tornou-se essa
coisa horrorosa de nos acostumarmos a nos banhar em águas sujas sem ter
esperança de que voltem a ficar limpas. Reler aquele livrinho (digo
livrinho porque era mesmo um livrinho de bolso com menos de cem
páginas), que eu li na época e tenho exemplar com autógrafos dos
autores, proporciona uma viagem ao passado e, tendo vivido as ilusões e
desgraças que vivemos nessas três décadas, pensar em como o Brasil
poderia ter sido melhor, se aquelas ideias tivessem sido implantadas, em
vez de sucumbirmos de forma lamentável ao neoliberalismo. Trinta anos
foi o período em que a China tornou-se o que é hoje. O que teria
acontecido com o Brasil se também tivesse começado um novo plano de
desenvolvimento próprio? Lembremos, rapidamente, que o Brasil começou a
existir como nação em 1930, com a revolução liderada por Getúlio Vargas;
a partir de então, em diferentes ritmos, direções e governos, seguimos
durante meio século um projeto nacional de desenvolvimento, até o
colapso da ditadura militar. A democracia que a minha geração ajudou a
restabelecer abandonou aquele projeto e adotou a cartilha neoliberal de
submissão ao capital internacional liderado pelo imperialismo americano.
Desde então nenhum outro plano foi apresentado aos brasileiros, exceto
este, do Ciro Gomes e do Mangabeira Unger. A tragédia brasileira é tão
grande que o prefácio me faz lembrar Nietzsche, que dizia falar do futuro como quem olha para o passado: o que está dito ali é
absolutamente atual, é de certa forma a previsão do que aconteceu nessas
três décadas. Quem quiser conferir o livrinho ou pelo menos ler o
prefácio e fazer sua própria avaliação, clique aqui. Como contraponto, publico vídeo do podcast
Calma urgente! em que Gregório Duvivier, de quem falei na postagem
anterior, louva o presidente Lula, emocionado. As pessoas que formam o
trio do programa estão entre as que mais admiro e me fazem pensar: a
quem ponto chegamos. Para ser exato, não estamos marcando passo há trinta anos e sim andamos para trás, voltamos à condição de nação exportadora de matérias-primas; pior: a devastação ambiental para proporcionar ao mundo os produtos primários que ele compra é hoje infinitamente mais rápida, mais extensa, mais danosa, alcançou a Amazônia, contamina solo, águas e ar, muda o clima.
Rever esse debate três anos depois é bizarro. Os dois estão errados, como eu achei no dia, mas há coisas que o tempo esclarece. A questão mais importante está no finalzinho, e Ciro estava certo. Ele pergunta ao Gregório se ele acha que a vitória do Lula vai pacificar o Brasil e Gregório responde que sim. Hoje, vemos que Gregório estava errado, isso não aconteceu. Será que Gregório faz autocrítica? Pelo que acompanho, não. Tampouco Ciro faz autocrítica dos seus inúmeros erros, inclusive essse de debater com um humorista, que, como diz, não tem procuração do Lula para falaar em nome dele, portante o debate não tem o menor sentido nos termos em que se dá e mostra, como diz acertadamente o Gregório, que Ciro estava perdido, embora afirmasse que ia ganhar a eleição, que ia conquistar a parcela dos 45% que não queriam nem Lula nem o bozo, que ia tirar o bozo do segundo turno e vencer Lula. Foi um delírio, ou um erro, mais um dos tantos que Ciro cometeu desde o final do século passado nas suas decisões políticas. Saiu da eleição muito menor do que entrou, ficou magoado (aliás já estava magoado com o lulopetismo, com razão, pois foi difamado e perseguido, e diz várias vezes que é o Gregório que está magoado: Freud explica), disse que nunca mais se candidatava, ficou ainda mais feroz contra o lulopetismo e suas chances hoje de ser presidente parecem nulas. E assim perdemos o melhor político da nossa época, da minha geração. Por que isso aconteceu? Acho que pelos seus sucessivos erros de escolha e avaliação, mas que eu resumiria em dois, um erro e um defeito, exatamente o oposto do Lula. O defeito é que Ciro é arrogante, o que o torna antipático. Ele diria que é sincero, honesto, autêntico, intransigente em relação a princípios, e talvez esteja correto, mas o fato é que não aglutina as pessoas em torno dele, como faz o Lula, e isso nos leva ao erro, que foi o maior acerto político do Lula: passou sua carreira trocando de partidos. Agora mesmo, a notícia mais recente é que vai sair do PDT e se filiar ao PSDB e ser candidato ao governo do Ceará. Ora, ele é fundador do PSDB, por que não ficou lá esse tempo todo? Poderia ter sido o candidato do partido à sucessão do FHC, mas preferiu sair e disputar a presidência em 1998 por outro partido. Depois trocou novamente e foi para o PDT; e é verdade que ficou lá muito tempo, mas o partido tinha outro dono. Lula tem esse mérito, fundou um partido e se tornou dono dele. Sou crítico disso, acho que o erro do Lula foi não ter se afastado da sucessão em 2010 para deixar que o partido se renovasse, mas quis manter o controle do partido, talvez voltar mais adiante, como acabou acontecendo, e impôs um poste para sucedê-lo. Deu no que deu. Lula é gigante e surpreendeu com a superação da sua queda, superou a prisão e voltou. Graças a quê? Ao partido que construiu. Mas voltou menor, magoado também, fraco, seu governo atual não passa de sombra comparado ao que foram os seus primeiros mandatos, o que confirma minha opinião de que, se ele tivesse sabedoria, teria se afastado em 2010 e deixado o PT e o Brasil se renovarem. Seria melhor para todos nós e para ele também. A obsessão do Lula pelo poder é tão grande e a dependência que os petistas têm dele é do mesmo tamanho que nossa época política virou a Era Lula e só vai acabar quando ele morrer. O Brasil também se tornou dependente dele. É isso que Gregório manifesta no "debate", essa submissão de políticos, intelectuais e artistas à liderança do Lula, como se sem ele não tivesse salvação, preferimos continuar dependentes dele no curso prazo e adiar a tragédia que virá mais dia menos dia, que já veio com Dilma, golpe, Temer, bozo, pandemia, tentativa de golpe e tudo que sofremos nesses últimos quinze anos. Dependência cega que não vê que relação entre nossa tragédia e essa submissão patológica ao Lula. Ao contrário do que pensam lulólatras, Lula não é imortal nem onisciente e o Brasil vai ficar órfão quando ele morrer, a esquerda vai ter de renascer, porque Lula não deixou nenhuma liderança se projetar, exceto seu antagonista, o bozo. Lula é um brilhante político, o maior da história do Brasil, fez coisas que nem Getúlio fez, isto é, ressuscitar, mas é também um estadista medíocre, nunca teve um projeto para o Brasil e governou para o capital, distribuindo migalhas para os pobres. Seguiu o modelo neoliberal do FHC e os lulólatras fingem não ver isso. Essa é a tragédia brasileira. Eleger um presidente que tenha um projeto nacional e apoio político é o que precisamos desde o Plano Real, é só o começo do que precisamos fazer, porque reverter a devastação do ambiente e a destruição do país é uma tarefa hercúlea, para décadas. No entanto, nem isso está no horizonte. O que Ciro pretende? Tornar-se governador do Ceará e se apresentar como alternativa para o pós-lulismo daqui a quatro anos? Tomara, mas o fato é que fará isso com atraso de trinta anos, em condições muito piores, com problemas muito maiores, especialmente a devastação ambiental, o desmonte da sociedade, o poder do crime organizado. Triste e terrível. A tragédia brasileira. Minha esperança não está mais no Ciro, está em novos atores. Não os vejo, mas a história é surpreendente. Quem esperava 2013? Aquelas mobilizações foram fantásticas, mas a esquerda não as compreendeu e foi a direita que herdou sua energia, parte também da tragédia brasileira. Talvez um novo 2013 seja diferente, talvez leve o Brasil para uma situação melhor.
Interocepção e propricepção. Você já ouviu falar desses sentidos? Sabe o que são? São os dois sentidos mais importantes. Depois vêm os outros cinco que apredemos e identificamos facilamente: tato, visão, audição, olfato, paladar.
Música de Irving Berlin, versão do Haroldo Barbosa. Haroldo Barbosa foi um craque das versões, letras precisas e preciosas, na medida certinha. Aplausos.Outro exemplo perfeito é Trevo de 4 folhas, versão de I'm looking over a four leaf clover, de Harry M. Woods e Mort Dixon.
Em resumo: os EUA são Hollywood, uma indústria de ilusões. O povo americano domina o mundo há um século fingindo ser o máximo, que todos querem copiar, mas na verdade vivem no luxo graças ao trabalho alheio. Consomem muito mais do que produzem, compram do mundo inteiro e emitem dinheiro sem parar, acumulando uma dívida de 39 trilhões de dólares que nunca pagam, que é financiada pelo mundo inteiro que compra títulos do tesouro americano e mantém o dólar como moeda de troca internacional. Acontece que, com a emergência da China como maior potência mundial, isso está acabando e os EUA entraram no modo desespero que elevou Trump a presidente, o autocrata que está taxando todos os países. O que significa isso? Significa que ele está obrigando as outras nações a continuar financiando a dívida americana. Se ele é mais eficaz do que os democratas para fazer isso, com seu método de parecer um maluco na loja de cristais, vai permanecer no poder. O excelente José Kobori explica isso, não exatamente o que escrevi, mas as informações para essas conclusões, na primeira resposta a perguntas de leitores.
Dívida USA, multiplicador keynesiano, austeridade fiscal, planejamento urbano.