terça-feira, 12 de agosto de 2025

Trinta anos marcando passo

Há trinta anos, Ciro Gomes e Roberto Mangabeira Unger publicaram um livrinho, O próximo passo -- uma alternativa prática ao neoliberalismo. Muita água passou debaixo da ponte depois, água que parecia boa, água que parecia melhor ainda, água ruim, água pior ainda, água contaminada, água que, há trinta anos, nos ventos auspiciosos do Plano Real, não podíamos imaginar que viria, de forma que nossa vida tornou-se essa coisa horrorosa de nos acostumarmos a nos banhar em águas sujas sem ter esperança de que voltem a ficar limpas. Reler aquele livrinho (digo livrinho porque era mesmo um livrinho de bolso com menos de cem páginas), que eu li na época e tenho exemplar com autógrafos dos autores, proporciona uma viagem ao passado e, tendo vivido as ilusões e desgraças que vivemos nessas três décadas, pensar em como o Brasil poderia ter sido melhor, se aquelas ideias tivessem sido implantadas, em vez de sucumbirmos de forma lamentável ao neoliberalismo. Trinta anos foi o período em que a China tornou-se o que é hoje. O que teria acontecido com o Brasil se também tivesse começado um novo plano de desenvolvimento próprio? Lembremos, rapidamente, que o Brasil começou a existir como nação em 1930, com a revolução liderada por Getúlio Vargas; a partir de então, em diferentes ritmos, direções e governos, seguimos durante meio século um projeto nacional de desenvolvimento, até o colapso da ditadura militar. A democracia que a minha geração ajudou a restabelecer abandonou aquele projeto e adotou a cartilha neoliberal de submissão ao capital internacional liderado pelo imperialismo americano. Desde então nenhum outro plano foi apresentado aos brasileiros, exceto este, do Ciro Gomes e do Mangabeira Unger. A tragédia brasileira é tão grande que o prefácio me faz lembrar Nietzsche, que dizia falar do futuro como quem olha para o passado: o que está dito ali é absolutamente atual, é de certa forma a previsão do que aconteceu nessas três décadas. Quem quiser conferir o livrinho ou pelo menos ler o prefácio e fazer sua própria avaliação, clique aqui. Como contraponto, publico vídeo do podcast Calma urgente! em que Gregório Duvivier, de quem falei na postagem anterior, louva o presidente Lula, emocionado. As pessoas que formam o trio do programa estão entre as que mais admiro e me fazem pensar: a quem ponto chegamos. Para ser exato, não estamos marcando passo há trinta anos e sim andamos para trás, voltamos à condição de nação exportadora de matérias-primas; pior: a devastação ambiental para proporcionar ao mundo os produtos primários que ele compra é hoje infinitamente mais rápida, mais extensa, mais danosa, alcançou a Amazônia, contamina solo, águas e ar, muda o clima. 

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