O país afunda em crise sem perspectivas. Alguns se apegam à
eleição presidencial, mas o povo – os caminhoneiros e aqueles que
vão ao seu encontro apoiá-los – não acredita que ela vá
resolver a situação. Mesmo porque todas as pesquisas mostram que
Lula é o preferido, e o prenderam para que não seja candidato. Ou
seja, para a maioria a eleição não é esperança, a esperança é
Lula, a esperança está presa.
Quem não vê isso não vê o Brasil. Aliás, isso vale também
para o PT. O PT não vê o Brasil, não entende a greve dos
caminhoneiros. Os olhos do PT são Lula, o PT está cego porque Lula
não pode ver o povo. E o que vemos nós? Uma esquerda apegada
desesperadamente a Lula, a maioria do país esperando que Lula a
salve. E outra parte minoritária, que se mobiliza, faz barulho e tem
apoio da globoetc., de empresários, de castas do serviço público e
do governo americano, que perdeu a última eleição e deu o golpe,
mas não se entende, é incompetente para governar, faz um governo
antipovo, antinacional, essa parte minoritária odeia Lula. E ela
está no poder, representada por Temer e sua quadrilha. E esse
governo corrupto e incompetente enfiou o Brasil no buraco.
E agora aparecem as consequências, nessa greve sem precedentes
dos caminhoneiros, que parou o Brasil, que revelou quanto o país depende do transporte
rodoviário de cargas. Praticamente todos os setores foram atingidos.
E já há desabastecimento, risco para setores essenciais, perdas
econômicas gigantescas. E a crise é tão profunda que mesmo o
governo cedendo em tudo a greve continua, porque a insatisfação
supera o problema do preço do diesel e da gasolina, e chega à
situação geral do país. E quando os caminhoneiros estão voltando
ao trabalho outras categorias aderem à paralisação.
Nenhuma categoria tem o impacto que têm os caminhoneiros, mas se
estes não voltarem as adesões podem levar a uma greve geral como
nunca aconteceu antes. Por isso o candidato da extrema direita,
apoiado por parte dos caminhoneiros, já falou que a greve tem que
acabar. E um dos “líderes” dos caminhoneiros denunciou
“infiltração” no movimento.
Para onde vai o Brasil? O golpe criou uma situação
pré-revolucionária, que pode ser vista na anomia, na falência das
instituições políticas, na desorganização da economia, no
desemprego, na miséria, na perda de direitos, na violência, na
criminalidade, na falência dos partidos, dos políticos, das
lideranças sociais.
O exército é uma ilusão, ele não tem mais a ideologia e os
líderes que o fizeram intervir na política republicana durante um
século, de 1889 a 1985. O maior partido político foi destruído
pelo golpe, é odiado e perseguido pela minoria protofascista. A
maior liderança nacional está presa. Nenhuma alternativa surgiu,
nenhum líder, nenhum partido, nenhum movimento. O que há de mais
organizado são o MST, o MTST, movimentos de mulheres, de negros, de
minorias, de estudantes, além das decadentes centrais sindicais. É
impossível dizer qual é o poder de mobilização da direita que
levou milhões às ruas pelo impeachment dois anos depois. E não se
pode esquecer a força social que os neopentecostais adquiriram nas últimas décadas, inclusive com muitos representantes
na política. Aquela união alcançada pela direita, no entanto, não
se mantém hoje.
Essa debilidade geral, esse esfacelamento político é que garante
(?) a realização de eleições em outubro. Aliás, se a esquerda
tivesse algum tirocínio, já teria levantado a bandeira da eleição,
incluindo nela as reformas profundas que a sociedade quer – uma
espécie de programa de salvação nacional que seria aprovado
juntamente com a eleição presidencial. Mas o PT só pensa em Lula,
sua única bandeira é Lula, e o PT é o partido mais influente da
esquerda, ainda, e Lula aprisiona nele o futuro do país.
O futuro do Brasil está aprisionado em Lula. Os golpistas
tiveram força para prender Lula, mas não têm força para impor sua
alternativa a ele. Porque estão divididos, porque são corruptos,
porque são impotentes, porque são entreguistas, porque não têm um
projeto nacional. Enquanto isso a esquerda não vira o jogo porque
não tem projeto alternativo ao golpe, seu projeto se resume a Lula,
a protestar e apresentar Lula como solução.
No entanto, e na ausência de Lula, a nação está à espera de um Napoleão, de um salvador, de uma autoridade capaz de assaltar o poder e consertar o país. E para onde nos levará esse
Napoleão, se e quando surgir? Que programa ele apresentará? Que
rumo? Que liderança?
Os ridículos que pedem intervenção militar não veem, por um
lado, que se o governo fosse militar eles não estariam nas ruas
protestando, e, por outro lado, que os militares não têm a
autoridade que esperam deles. Quando tiveram, não fizeram melhor do
que o que temos hoje, entregaram o país tão caótico quanto ele
está hoje, e não gostaram da experiência que tiveram. Os militares
não querem voltar. Os ridículos que pedem intervenção militar não
veem o pior: que pedem a força porque são fracos, incapazes de
governar sua própria vida, decidir, pensar, escolher, assumir
responsabilidades; têm que ser mandados, têm que obedecer como
cãezinhos amestrados.
Os militares não são solução, os militares não vão voltar, e
nós, brasileiros comuns, sem farda, cidadãos, é que temos de
assumir a responsabilidade de governar esse país imenso e rico, que
pode ser uma grande nação, se nos colocarmos à altura dela, à
altura da missão de superar o caos atual e construí-la,
democraticamente.