segunda-feira, 6 de dezembro de 2021

Esse Atlético não é o meu


Os muitos atleticanos – parentes e amigos – que me perdoem, mas esse não é o meu Atlético. Neste momento de festa longamente esperado, venho desafinar o coro dos contentes. Eu devia estar contente pelo bicampeonato conquistado cinquenta anos depois do primeiro título, mas confesso abestalhado que estou decepcionado. Porque foi tão fácil conseguir e agora eu me pergunto: e daí?

Deixando de lado as citações de Vinícius, Torquato e Raul (Paulo), o fato é que o Atlético bicampeão não é o Atlético pelo qual cresci e vivi torcendo. O meu Atlético era um time popular, esse Atlético é um clube de ricos, banqueiros, empreiteiros, uma herança da Copa do Mundo de 2014, página infeliz da nossa história, quando os ricaços se apoderaram dos estádios e do esporte popular brasileiro.

Impossível não me alegrar vendo a virada épica em quatro minutos contra o Bahia, em plena Salvador. Impossível não admirar esse time vencedor, cheio de talentos, aguerrido, sem compromisso com o passado de derrotas nos momentos decisivos (que começou a ser deixado para atrás, reconheçamos, em 2013 e 2014). Foi por isso que eu esperei cinquenta anos, mas a espera foi tanta que, quando ela terminou, o Atlético não era mais o Atlético. Não o meu.

Foi sua torcida apaixonada, foi a massa que fez o Atlético ser o que é, mas agora ela não pode ir ao estádio. No meu Atlético, a torcida pagava cinco reais para ficar em pé na geral e dez para sentar confortavelmente no concreto da arquibancada, onde a gente mais fica em pé do que sentado. Nesse novo Atlético, de banqueiros e empreiteiros, a massa tem que pagar 120 reais pelo ingresso mais barato do jogo. Quem pode?

Esse detalhe a que ninguém parece dar importância faz toda diferença para mim. Os pragmáticos vão argumentar que é o futebol moderno, do clube empresa, do futebol negócio, que movimenta bilhões, exige profissionalismo, competência e outras qualidades. O Galo teve sorte de encontrar empresários interessados em investir no time, no clube, num estádio próprio, novinho em folha. Basta mirar nosso rival e comparar que o sucesso atleticano fica ainda mais espetacular.

Esse modelo eficiente e seus cabeções, que vão à Europa conhecer o Manchester City e posar numa projeção da imagem do grande Guardiola (foto), conduziram o Atlético ao tão esperado título e prometem que isso é só o começo. Muito mais está por vir, o clube entrou no seleto grupo dos grandes e visa à cena mundial. Por isso mesmo seu modelo é o dos clubes europeus vitoriosos e milionários.

Está certo, parece um caminho promissor e só poderíamos ficar felizes, mas que sujeito chato sou eu que não vê graça em nada! Eu devia desfrutar da felicidade rara e especial nessa época de pandemia e de bozo, mas fico olhando para fotos de banqueiros e empreiteiros, fico ouvindo entrevista de empresários e pensando bobagem!

Fico pensando que seguir o competente e vitorioso modelo europeu pode estar certo, mas há uma diferença entre o torcedor europeu e o torcedor brasileiro: nós somos pobres, não podemos pagar 120 reais pelo ingresso mais barato. 

Essa é a contradição do Atlético bicampeão brasileiro: ele é o que é porque sua torcida nunca o abandonou, mas sua torcida foi abandonada por ele.

O Atlético vencedor, o Atlético dos empreiteiros e banqueiros só pôde se tornar o que seus novos donos estão fazendo dele porque tem uma torcida popular, “uma torcida muito mais barulhenta do que a do City” (palavras de um dos mecenas). Essa torcida que nunca abandonou o clube, nem nos seus piores momentos, agora é abandonada por ele, nos seus melhores momentos. O clube agora cobra ingressos que ela não pode pagar. Esse Atlético é um clube de elite, um time caro para desfrute de ricos e lucro de ricaços, não é o clube da massa, não é o meu Atlético.

O investimento dos banqueiros e empreiteiros terá retorno? Quanto da receita do Atlético vem hoje do torcedor, de ingressos, camisas etc.? Um jogo, como o deste domingo, com estádio lotado, dá ao clube 9 milhões de reais. O título da Copa do Brasil, mais 71. Um time de ponta movimenta muito dinheiro, mas será possível ter ao mesmo tempo esse caro futebol e uma torcida pobre? Terá o Atlético 62 mil torcedores ricos para encher o Mineirão em todos os jogos? (Ou 46 mil, lotação do novo estádio, que encolhe forçadamente uma torcida acostumada a superar o público de 50 mil.) Se o retorno do investimento não vier, o que farão os abnegados empreiteiros e banqueiros? Venderão seu negócio Atlético para capitalistas estrangeiros? É possível.

Seja como for, o atleticano pobre, aquele que torcia contra a vento, na tempestade, se houvesse uma camisa preta e branca pendurada num varal, foi expulso do estádio. Eu, particularmente, já gosto mais de ver torneios de isqueite, esporte que talvez seja o novo futebol: popular, na rua, emocionante e de graça.

sábado, 20 de novembro de 2021

Os melhores filmes que eu vi


Entre 1968 e 1974 eu vi os melhores filmes da minha vida -- a exceção é o primeiro filme dos Beatles (Os reis do iê iê iê, na versão brasileira), que é anterior. Depois vieram outros, mas vistos de forma diferente, sem o impacto emocional desta lista. Talvez tenha esquecido de algum; se lembrar, acrescento depois. 

A hard day’s night, de Richard Lester

Romeu e Julieta, de Franco Zeffirelli

Butch Cassidy & The Sundance Kid, de George Roy Hill

Marcelo Zona Sul, de Xavier de Oliveira

Minha namorada, de Zelito Viana

Voar é com os pássaros, de Robert Altman

Ensina-me a viver, de Hal Ashby

O sopro no coração, de Louis Malle

Aguirre, a cólera dos deuses, de Werner Herzog

Vai trabalhar, vagabundo, de Hugo Carvana

A Noite Americana, de François Truffaut

Lacombe Lucien, de Louis Malle

O enigma de Kaspar Hauser, de Werner Herzog 

PS: Mais tarde vi grandes filmes, como os de Luc Besson (Anna, Nikita, O Profissional, O Quinto Elemento), para citar um diretor extraordinário. Alguns se tornam cada vez melhores cada vez que os revejo, são verdadeiras obras-primas: Paris, Texas, de Wim Wnders (1984), por exemplo, e vários brasileiros: Que Horas Ela Volta?, de Anna Muylaert (2015), Houve uma Vez dois Verões, de Jorge Furtado (2002), Auto da Compadecida, de Guel Arraes (2000), Central do Brasil, de Walter Salles (1998), Menino Maluquinho, o Filme, de Helvécio Ratton (1995), Pra Frente, Brasil, de Roberto Farias (1982). 

PS2: Helvécio Ratton e Jorge Furtado são autores de várias obras-primas. É impossível citar Menino Maluquinho e não falar de Amor & Cia (1998, montado pela minha ex-colega de curso Diana Vasconcellos; aliás, leio que ela é montadora de Medida Provisória, que ainda não vi), Uma Onda no Ar (2002), Batismo de Sangue (2006) e Pequenas Histórias (2007). É impossível citar Houve uma Vez dois Verões e não lembrar de Ilha das Flores (1989), O Homem que Copiava (2003), Meu Tio Matou um Cara (2004) e Saneamento Básico (2007).