Talvez não tenha existido na Tropicália de tantos talentos geniais poeta mais genial do que Torquato. Basta pensar em Gilberto Gil, Caetano Veloso, Tom Zé, Jorge Ben, Mutantes. Basta pensar em Marginália II, Louvação, Geleia Geral Mamãe Coragem, Cogito, Go back, Pra dizer adeus. Cito algumas canções primorosas, mas todas as letras do álbum Patrícia Ahmaral canta Torquato Neto são primorosas, verdadeiras pérolas a demonstrar que a melhor poesia brasileira está na MPB e atingiu o cume com o letrista piauiense. O piropo Zabelê é de dar inveja a Vinicius de Morais. Torquato, que suicidou em 1972, aos 28 anos, foi letrista, não foi músico, todas as canções do álbum são divididas com outros compositores.
Primoroso também é o álbum: arranjos, instrumentos, vozes. Um presente para ouvidos cansados de tanta mediocridade. Tem importância equivalente ao song book Balaio do Sampaio, de 1998, talvez maior. Diferentemente deste (iniciativa do músico Renato Piau, que contou com interpretações de cantores do primeiro time), o álbum da Patrícia é a concretização de um projeto pessoal e antigo da cantora belo-horizontina, intérprete das 19 canções. O álbum duplo é composto dos discos Um poeta desfolha a bandeira e A coisa mais linda que existe.
Ela não está sozinha, porém. Em torno do projeto, viabilizado com recursos de incentivo cultural e financiamento coletivo, reuniu um time igualmente de primeira, a começar por Zeca Baleiro. O compositor e cantor maranhense com estreitas relações com Minas Gerais e que tem se dedicado, paralelamente ou como parte da sua carreira, a apoiar trabalhos que lançam luzes sobre grandes músicos brasileiros e cantores menos famosos, é o diretor artístico do álbum. Para acompanhá-la nas gravações, Patrícia contou com Jards Macalé, Banda de Pau e Corda, Chico César, Ná Ozzetti, Paulinho Moska, Moda de Rock, Maurício Pereira e Tonho Penhasco, além do próprio Zeca Baleiro. Na produção estão Rogério Dalayon, Marion Lemmonier e Walter Costa.
Patrícia Ahmaral foi jornalista na juventude; felizmente para a música, encaminhou-se para o canto. Começou sua carreira no ambiente do criativo e tropicalista rock belo-horizontino dos anos 80 animado pelo falecido poeta Marcelo Dolabela, cujas influências a acompanham. É irmã do Ricardo Amaral, este sim um bem-sucedido repórter político que há alguns anos ligou sua trajetória profissional à do presidente Lula, de cujo instituto é assessor.
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