sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Lula, o filho do Brasil não decifra Luiz Inácio da Silva

O filme tem um belo começo, no sertão nordestino, aquele ambiente de outro filme maravilhoso, Central do Brasil. O cachorro da família, uma espécie de Baleia de Vidas Secas, correndo atrás do pau de arara, é tocante e a imagem muito bonita. Embora prenuncie clichês, abre nosso coração. Mas é só isso, ou quase. O filme vai bem enquanto nos conta o que não sabemos: a chegada da família Silva a Santos, o artifício usado por Jaime, irmão de Lula, a mudança para São Bernardo, a infância miserável. Ainda assim, o pequeno Luiz pouco se mostra, como ao defender a mãe diante do pai, que a agredia. A cena em que convence uma mulher a comprar laranjas ensaia mostrar que o menino já tem o dom da oratória, mas nada depois reforça essa ideia, até que Lula surge líder de massas, dirigindo a maior assembleia operária da história do país, de cem mil pessoas. Aí, porém, o filme já tinha desabado entre os dois amores de Lula e seu casamento com o sindicato. Mais uma vez, o filme parece querer mostrar que Lula é predestinado. E dona Lindu, que sem ela Lula não seria Lula. Não é ela quem garante que o filho estude? Nesse ponto, desponta o clichê do pobre que venceu porque estudou, com dificuldade, mas a inteligência que chama atenção da sua professora não se expressa na vida de Lula, exceto no fato de cursar o Senai. É pouco. A mais cara produção nacional (R$ 16 milhões) é bem feita, tem boa fotografia e bons atores, com destaque para o ator principal, Rui Ricardo Diaz, cuja voz parece a do próprio Lula, e Glória Pires, que está muito bonita. Filmes sobre personagens históricas têm que resolver algumas armadilhas inevitáveis, como as passagens que todos conhecemos. São pontos em que a ficção se encontra com a realidade. A cena da perda do dedo não passou no teste, a morte de dona Lindu foi melhor. O melhor talvez esteja nas cenas dramáticas enfrentadas por Lula, que fazem parte da vida dos brasileiros comuns e nos mostram que temos um presidente que veio do povo. O filme pouco mais nos revela: que Lula mergulhou na vida sindical porque sua cabeça não estava boa e ele tinha medo de enlouquecer... É pouco, muito pouco para uma das maiores personagens da história brasileira, das poucas que alcançaram dimensão mundial. Uma sinopse da trajetória de Lula impressiona muito mais do que o filme de Fábio Barreto. O que pensa Lula? Por que faz o que faz, por que se torna quem é? Lula... não decifra Luiz Inácio. O pano de fundo histórico, a ditadura militar, não tem dramaticidade, assim como Lula não tem profundidade. Pode-se argumentar que o filme não pretende criar um mito, mas o mito está aí. E é preciso decifrá-lo.