segunda-feira, 14 de dezembro de 2009

Calçadas democráticas

Há tempos digo que o melhor sinal da educação dos habitantes de uma cidade é a qualidade dos passeios públicos. Belo Horizonte, por exemplo, segue a regra nacional: tudo aos carros, nada para os pedestres. Fiquei feliz em saber que também pensa assim o economista Enrique Peñalosa, celebrado em todo o mundo pelas inovações que implantou como prefeito de Bogotá. A entrevista é de Deborah Solomon, tem data de 8 de junho de 2008 e foi publicada no New York Times. A tradução pode ser lida na íntegra no último segundo (link no final). A seguir, alguns trechos.

"- Qual a primeira coisa que você diz para prefeitos fazerem?

- Nos países em desenvolvimento, a maioria das pessoas não tem carros. Então digo: quando você faz uma boa calçada, está construindo democracia. Calçadas são símbolos de igualdade.

- Calçadas não me parecem prioridades nos países em desenvolvimento.

- São a última coisa que fazem. A prioridade é fazer estradas e avenidas. Fazemos cidades para carros, carros, carros, carros. Não para pessoas. Carros foram inventados muito recentemente. O século 20 fez um desvio horrível na evolução qualitativa do habitat humano. Construímos, hoje, pensando mais na mobilidade de carros do que na felicidade das crianças.

- Mesmo em países nos quais a maioria não tem como comprar carros?

- As pessoas de maior renda nos países em desenvolvimento nunca andam. Elas vêem a cidade como um espaço ameaçador. Passam meses sem andar uma única quadra.

- Isso também não é verdade para os EUA?

- Não em Manhattan, mas há muitos subúrbios em que não há calçadas, o que é sinal de falta de respeito para com a dignidade humana. As pessoas sequer questionam isso. É como a França pré-revolucionária. As pessoas achavam que a sociedade estava normal, assim como as pessoas acham normal, hoje, que o acesso à praia em Long Island seja particular.

- Você está comparando pessoas com casa com vista para o mar em Long Island com aristocratas franceses corruptos?

- Se a democracia prevalecer, o bem comum deve vencer interesses privados. A pergunta é: a maioria das pessoas seria beneficiada com acesso à praia em Long Island? Todas as crianças deveriam ter acesso à praia sem precisar freqüentar um country club. […]

- Onde você estudou?

- Duke University. Me formei em economia e história.

- Você devia ser o único socialista em Duke.

- Acabei percebendo que o socialismo era um fracasso como sistema econômico. Mas a igualdade não morreu. O socialismo morreu. Mas o desejo de igualdade não está morto."


http://ultimosegundo.ig.com.br/new_york_times/2008/06/11/perguntas_para_enrique_penalosa_um_homem_com_um_plano__1353153.html