terça-feira, 29 de maio de 2018

A esperança está presa

O país afunda em crise sem perspectivas. Alguns se apegam à eleição presidencial, mas o povo – os caminhoneiros e aqueles que vão ao seu encontro apoiá-los – não acredita que ela vá resolver a situação. Mesmo porque todas as pesquisas mostram que Lula é o preferido, e o prenderam para que não seja candidato. Ou seja, para a maioria a eleição não é esperança, a esperança é Lula, a esperança está presa.

Quem não vê isso não vê o Brasil. Aliás, isso vale também para o PT. O PT não vê o Brasil, não entende a greve dos caminhoneiros. Os olhos do PT são Lula, o PT está cego porque Lula não pode ver o povo. E o que vemos nós? Uma esquerda apegada desesperadamente a Lula, a maioria do país esperando que Lula a salve. E outra parte minoritária, que se mobiliza, faz barulho e tem apoio da globoetc., de empresários, de castas do serviço público e do governo americano, que perdeu a última eleição e deu o golpe, mas não se entende, é incompetente para governar, faz um governo antipovo, antinacional, essa parte minoritária odeia Lula. E ela está no poder, representada por Temer e sua quadrilha. E esse governo corrupto e incompetente enfiou o Brasil no buraco.

E agora aparecem as consequências, nessa greve sem precedentes dos caminhoneiros, que parou o Brasil, que revelou quanto o país depende do transporte rodoviário de cargas. Praticamente todos os setores foram atingidos. E já há desabastecimento, risco para setores essenciais, perdas econômicas gigantescas. E a crise é tão profunda que mesmo o governo cedendo em tudo a greve continua, porque a insatisfação supera o problema do preço do diesel e da gasolina, e chega à situação geral do país. E quando os caminhoneiros estão voltando ao trabalho outras categorias aderem à paralisação.

Nenhuma categoria tem o impacto que têm os caminhoneiros, mas se estes não voltarem as adesões podem levar a uma greve geral como nunca aconteceu antes. Por isso o candidato da extrema direita, apoiado por parte dos caminhoneiros, já falou que a greve tem que acabar. E um dos “líderes” dos caminhoneiros denunciou “infiltração” no movimento.

Para onde vai o Brasil? O golpe criou uma situação pré-revolucionária, que pode ser vista na anomia, na falência das instituições políticas, na desorganização da economia, no desemprego, na miséria, na perda de direitos, na violência, na criminalidade, na falência dos partidos, dos políticos, das lideranças sociais.

O exército é uma ilusão, ele não tem mais a ideologia e os líderes que o fizeram intervir na política republicana durante um século, de 1889 a 1985. O maior partido político foi destruído pelo golpe, é odiado e perseguido pela minoria protofascista. A maior liderança nacional está presa. Nenhuma alternativa surgiu, nenhum líder, nenhum partido, nenhum movimento. O que há de mais organizado são o MST, o MTST, movimentos de mulheres, de negros, de minorias, de estudantes, além das decadentes centrais sindicais. É impossível dizer qual é o poder de mobilização da direita que levou milhões às ruas pelo impeachment dois anos depois. E não se pode esquecer a força social que os neopentecostais adquiriram nas últimas décadas, inclusive com muitos representantes na política. Aquela união alcançada pela direita, no entanto, não se mantém hoje.

Essa debilidade geral, esse esfacelamento político é que garante (?) a realização de eleições em outubro. Aliás, se a esquerda tivesse algum tirocínio, já teria levantado a bandeira da eleição, incluindo nela as reformas profundas que a sociedade quer – uma espécie de programa de salvação nacional que seria aprovado juntamente com a eleição presidencial. Mas o PT só pensa em Lula, sua única bandeira é Lula, e o PT é o partido mais influente da esquerda, ainda, e Lula aprisiona nele o futuro do país.

O futuro do Brasil está aprisionado em Lula. Os golpistas tiveram força para prender Lula, mas não têm força para impor sua alternativa a ele. Porque estão divididos, porque são corruptos, porque são impotentes, porque são entreguistas, porque não têm um projeto nacional. Enquanto isso a esquerda não vira o jogo porque não tem projeto alternativo ao golpe, seu projeto se resume a Lula, a protestar e apresentar Lula como solução.

No entanto, e na ausência de Lula, a nação está à espera de um Napoleão, de um salvador, de uma autoridade capaz de assaltar o poder e consertar o país. E para onde nos levará esse Napoleão, se e quando surgir? Que programa ele apresentará? Que rumo? Que liderança?

Os ridículos que pedem intervenção militar não veem, por um lado, que se o governo fosse militar eles não estariam nas ruas protestando, e, por outro lado, que os militares não têm a autoridade que esperam deles. Quando tiveram, não fizeram melhor do que o que temos hoje, entregaram o país tão caótico quanto ele está hoje, e não gostaram da experiência que tiveram. Os militares não querem voltar. Os ridículos que pedem intervenção militar não veem o pior: que pedem a força porque são fracos, incapazes de governar sua própria vida, decidir, pensar, escolher, assumir responsabilidades; têm que ser mandados, têm que obedecer como cãezinhos amestrados.

Os militares não são solução, os militares não vão voltar, e nós, brasileiros comuns, sem farda, cidadãos, é que temos de assumir a responsabilidade de governar esse país imenso e rico, que pode ser uma grande nação, se nos colocarmos à altura dela, à altura da missão de superar o caos atual e construí-la, democraticamente.