O capitalismo é um sistema econômico que atravessa séculos se transformando, se implantando, se estabelecendo, se defendendo para sobreviver. O capitalismo operou maravilhas na civilização, mas as fez paralelamente a muitas destruições. Desde sempre – basta pensar nos povos indígenas da “América” e nos africanos escravizados. Por quê? Porque seus fundamentos são injustos: propriedade privada dos meios de produção, apropriação privada das riquezas, busca incessante do lucro, que significa produzir cada vez mais, destruir cada vez mais os recursos naturais, explorar o trabalho o mais que puder. Esse móvel do capitalismo é incompatível com planejar o futuro, distribuir as riquezas, democratizar o poder. No capitalismo há sempre poucos ganhando muito e desfrutando das riquezas produzidas, enquanto muitos trabalham, ganham e desfrutam pouco. É a essência do sistema.
A história se dá por luta de classes, em última instância. Os capitalistas ascenderam porque lutavam contra a ordem feudal e lideraram as classes oprimidas. Representavam o crescimento econômico, o progresso, o aumento das riquezas materiais e imateriais – conhecimento, artes, liberdade. Prometeram liberdades e direitos, que, uma vez no poder, nunca foram capazes de cumprir integralmente e universalmente, porque vão contra seus interesses. Ao longo dos séculos, os capitalistas usaram de todos os recursos para se manter no poder e realizar seus interesses, seja a guerra, seja o golpe de estado, seja o fascismo, seja a ditadura militar. Um desses recursos é a manipulação da informação, por meio dos meios de comunicação de massa tradicionais (jornais, rádio, televisão, cinema), controlados por meia dúzia de imensos e poderosíssimos grupos, e que constituem uma espécie de partido moderno do capital. Porque é óbvio que o capitalismo compromete a sobrevivência da existência humana, destrói o planeta, impede a justiça e a distribuição de riquezas, fomenta guerras, provoca crises econômicas – e a realidade precisa ser escondida e deturpada.
Depois de algumas décadas em que grassou a ideologia mais sincera do capitalismo, o liberalismo, agora batizado de "neoliberalismo" (de forma resumida, ela sustenta que o mercado livre resolve todos os problemas, portanto odeia ações do Estado que distribuem renda, aumentam impostos, criam estruturas; na verdade, os liberais querem e sempre tiveram o Estado agindo a seu favor, implantando políticas que fomentam os lucros, como obras públicas para a indústria da construção, desemprego para baixar o preço da mão-de-obra, investimentos em estruturas que auxiliam os negócios etc.; quando discursam contra a intervenção do Estado na economia, na verdade os capitalistas querem dizer "intervenção do Estado na economia que não seja a nosso favor, que seja a favor dos trabalhadores"), depois de algumas décadas em que o neoliberalismo grassou, uma nova crise econômica exigiu intervenção do Estado para preservar o sistema.
Esse é um caminho inaugurado há quase um século, caminho que salvou o capitalismo das crises que quase o destruíram no século XX, representadas por duas guerras mundiais, a revolução russa e outras revoluções socialistas, uma crise mundial e a ascensão do fascismo. Desde então os capitalistas vêm alternando políticas liberais e políticas intervencionistas, estas quando aquelas falham. Enquanto a crise não vem, o liberalismo grassa, porque garante lucros fantásticos; quando a crise vem, o Estado intervém para salvá-lo, criando novas regras e políticas – e lucros renovados.
É claro que as políticas sociais dos momentos de crise do capitalismo são melhores para os trabalhadores, porque distribuem renda, criam benefícios, ampliam direitos. É isso que os capitalistas temem – quanto menos anéis cederem para conservar a mão, melhor para eles. Além do mais, nesses momentos, se preservadas as regras do jogo político, isto é, as eleições burguesas, costumam ser vitoriosos políticos que têm apelo reformista e partidos mais próximos do povo.
Em geral esses partidos e políticos são de esquerda, são socialistas e democráticos, mas podem também ser de direita – o partido nazista era reformista. Os capitalistas usam de todos os recursos para se manterem no poder, inclusive partidos fascistas e militares sanguinários. Atualmente, os capitalistas mantêm a indústria da guerra com exércitos terceirizados, milícias mercenárias organizadas na forma de empresas prestadoras de serviços aos Estados, especialmente aos EUA da era Bush neoliberal.
Os efeitos do reformismo de esquerda são nefastos para o capitalismo, porque difíceis de serem revertidos; os efeitos do reformismo de direita também, porque nunca se sabe onde vão parar; geralmente acabam mal, na tomada do poder por reformistas do extremo oposto – daí a importância de transições negociadas e sem convulsões, como a que aconteceu no Brasil em 1985 (o Brasil é um excelente modelo de ordem capitalista bem-sucedida, uma vez que governos de esquerda se encarregaram de implantar, sucessivamente, o liberalismo e o reformismo social, de acordo com as regras e sem grandes transtornos).
O liberalismo é o melhor modelo para os capitalistas, não por ideologia política – isso é a classe média que trata de criar, com suas teorias e academicismos. O liberalismo é o melhor para os capitalistas porque lhes permite ganhar muito dinheiro sem muitos riscos e aborrecimentos, com o Estado todo trabalhando a seu favor, com dedicação. Como ele sempre falha, porém, eles aceitam a intervenção reformadora de esquerda, mas zelam para que ela não vá longe demais, que apenas recupere as condições para um novo ciclo de expansão e uma nova vaga liberal. Na verdade, desde que o revolução socialista operária saiu de cena, a questão social se limita a isso: saber quanto o capitalismo será transformado por um novo ciclo de reformas, que duração e profundidade terão essas reformas, quão irreversíveis na história da humanidade elas serão, e se, enfim, acabarão por substituir o capitalismo por um sistema econômico mais evoluído.