Uma vez, quando trabalhava no JB, acompanhei as filmagens de "O grande mentecapto", em Barbacena. Na volta à redação, escrevi uma matéria diferente. Como era para o Caderno B, ousei. Esqueci o lide, a pirâmide invertida e outros cânones. Falei dos bastidores da filmagem, que eu via pela primeira vez e que foi o que me impressionou. Não foi uma reportagem brilhante, mas acho que foi criativa. Para minha surpresa, Zé de Castro mandou-a para o Rio do jeitinho que eu escrevi. A matéria nunca foi publicada. Foi talvez minha maior decepção no jornal. Desde então me dediquei aos clichês – matérias corretas, mas clichês.
Lembrei disso lendo o blog da Ana Paula (http://escritosaovento.blogspot.com/). Sempre achei que o mais interessante do jornalismo não sai nos jornais. Se teve um jornal que me motivou a ser jornalista foi o Ex-, publicado nos idos de 1970, e que deixou de circular depois de uma edição em que o principal conteúdo era uma reportagem sobre o assassinato do jornalista Vladmir Herzog nos porões do Doi-Codi, em São Paulo. Foi o único jornal a tratar do assunto, como um camicase. A imprensa estava então sob censura. Não deu outra: o grande jornaleco foi recolhido e proibido. A irreverente e corajosa equipe lançou outro, idêntico, mas com outro nome: Mais Um, letras imitando a marca Coca Cola. Também foi recolhido. Ambas as edições, porém, chegaram a ser vendidas, e eu, um atento leitor, um rato de banca de revista, pude comprá-las. Ainda as guardo comigo, surradas, amareladas, rasgadas. Eu venerava o Ex- porque seu jornalismo nunca escondeu os bastidores da notícia. Nele, o repórter sempre foi mais importante que o editor e as notícias nunca foram impessoais. É muito difícil fazer jornalismo assim, só gente experiente e talentosa consegue. Ele não deve se confundir com jornalismo de opinião irrelevante, no qual o jornalista em vez de informar emite suas opiniões absolutamente desinteressantes.
A internet possibilita hoje uma complementariedade ao trabalho do repórter. Paralelamente ao seu trabalho tradicional, de cumprimento da pauta, ele pode escrever um diário de bastidores, uma espécie de making of da notícia, no qual conta o que não sairá no jornal, inclusive suas impressões e opiniões. Pode fazer isso escrevendo textos e fragmentos num blog e indicando tais posts no twitter. Digo que o repórter pode fazer isso, acho que ainda não faz, ou poucos fazem, de forma incipiente e sem entender o caráter revolucionário de um trabalho assim. Imagino um blog de repórteres compartilhando a cobertura diária feita para os grandes veículos...