No Brasil, isso seria chamado de golpe e se pregaria seu impeachment imediato.
Apesar do governo medíocre que fez (o presidente negro americano frustrou expectativas de esquerda, como Lula, mas não fez um governo surpreendentemente bom, como o presidente operário brasileiro), provavelmente Obama passará à história por esse ato.
Interessante também como os EUA, seja qual for o presidente e faça o que fizer, o país tem princípios orientadores aparentemente imutáveis, como reafirma Obama em relação à imigração.
Do El País Brasil.
Reforma nos EUA
Obama: “A imigração é o que nos define como país”
O presidente dos EUA defende sua ação executiva de evitar as deportações
O presidente dos EUA defende sua ação executiva de evitar as deportações
Yolanda Monge
Washington
21 NOV 2014 - 10:07 BRST
Barack Obama
dividiu as águas na noite de quinta-feira e avançou em uma direção que
não gostaria, mas que se mostrou ser o único caminho livre para salvar
parte da palavra prometida a um grupo que representa 17% da população
dos Estados Unidos – 54 milhões de pessoas, mais de 25 milhões delas com
direito a voto. Com a decisão de dar as costas a um Congresso que deteve sua presidência
e o condenou a não assinar nenhuma lei de peso, com exceção da reforma
na saúde – que segue sofrendo embates -, o presidente dos Estados Unidos
põe fim a uma batalha para iniciar a guerra.
Com uma frustração disfarçada de elegância, Obama se dirigiu à nação
em um simbólico horário de máxima audiência. Simbólico porque nenhuma
das três grandes redes de televisão decidiu exibir o discurso
presidencial em uma noite cheia de seriados e espetáculos que valem
milhões de dólares em publicidade e espectadores. Apenas a Univisión
transmitiu ao vivo as palavras do presidente, tendo que interromper
durante 14 minutos e 57 segundos a transmissão do Grammy Latino – assim
se faz história.
Como se fosse uma saga, o presidente contou uma história.
A história de um país que há mais de 200 anos tem a tradição de receber
imigrantes de todas as partes do mundo, o que o beneficia. “A imigração
nos define como país”, disse Obama. E, como em toda boa saga, houve
partes trágicas, amores não correspondidos, lágrimas e até uma moral por
trás da história. O presidente lembrou que este país, a nação que foi
criada por gente vinda de fora, tem hoje um sistema de imigração falido,
com 11 milhões de pessoas vivendo nas sombras.
“Quando cheguei à Casa Branca me comprometi a consertar o sistema”, disse Obama, que abriu a narrativa referindo-se à segurança da fronteira, para, já de entrada, neutralizar aqueles que acreditam que a palavra “imigrante” só rima com “delinquência”. “Durante os últimos seis anos, as entradas ilegais diminuíram pela metade”, informou o homem que já foi chamado pelos ativistas pró-imigração de “deportador chefe”. Nesse ponto, Obama fez uma referência à grave crise humanitária vivida na fronteira no verão passado após a chegada aos Estados Unidos de milhares de menores de idade desacompanhados.
“No entanto, o número de pessoas que tenta cruzar a fronteira de maneira ilegal se encontra hoje em seu nível mais baixo desde a década de setenta”, destacou Obama. Recorrendo então a seus dotes mais didáticos, propiciando um “crescendo” e após declarar que o Congresso tinha se tornado um muro intransponível para sua ambiciosa lei de reforma – que teria aberto as portas para a legalização de milhões de indocumentados – , Obama afirmou que, como presidente, tem a autoridade para adotar medidas executivas e que é isso o que vai fazer.
“Primeiramente, continuaremos equipando a fronteira com mais recursos”. “Em segundo lugar, será mais simples para os imigrantes com estudos, empresários e pessoas de alto perfil permanecerem e contribuírem com nossa economia”. “Em terceiro lugar, daremos os passos necessários para tratar de maneira responsável os milhões de imigrantes ilegais que já vivem no nosso país”.
O terceiro ponto foi aquele que o presidente quis estender. Foi esse o assunto que o fez se transformar, de repente, no professor Obama. Apesar de antes de fazê-lo ter vestido a roupa de um homem de consenso e recordar as palavras que outro político que já ocupou o mesmo cargo costumava dizer em relação aos imigrantes que tornam possível o dia-a-dia dos Estados Unidos. “Como disse uma vez meu antecessor, o presidente Bush: ‘Eles são parte da vida americana’”. Obama descreveu o núcleo de sua ação executiva desta maneira: “Se você já está nos EUA há mais de cinco anos; se você tem filhos que são cidadãos americanos ou residentes legais; se você se registrar, passar por um controle de antecedentes criminais e estiver disposto a pagar uma parte justa dos impostos que deve; você poderá permanecer neste país temporariamente, sem medo de ser deportado. Você pode sair das sombras e fazer as pazes com a lei”.
Não houve acompanhamento musical. Mas Obama acabava de iniciar a
maior de todas as batalhas, a cruzada que pode fazer com que, em pouco
mais de duas semanas, os republicanos ameacem com um novo isolamento do Governo
como represália por sua atitude. Estava na mesa o assunto que definirá
os próximos dois anos e que deverá ser prioridade que quem quer que seja
o novo mandatário dos Estados Unidos em 2017. Obama tinha consciência
disso. Sabe bem o que estava fazendo. Razão pela qual contra-atacou com
sua dose habitual de bipartidarismo e memória histórica.
“As ações que estou tomando não só são legais como são o tipo de medida adotada por cada presidente republicano e cada presidente democrata durante o último meio século. E para os membros do Congresso que questionam minha autoridade para fazer com que nosso sistema de imigração funcione melhor, ou questione meu julgamento de agir onde o Congresso falhou, tenho uma resposta: ‘Aprovem uma lei’”.
Tudo estava dito. Obama acabava de jogar a bola para o campo republicano. Tinha movido as peças. Tinha se rebelado diante da inação e até perguntou se, por acaso, os EUA não seriam uma nação que tolera a hipocrisia, deixando que trabalhadores ilegais colham frutos e arrumem as camas enquanto se olha para o outro lado.
“Sei que muitos dos que criticam a ação que estou tomando chamam isso de anistia”, disse o presidente. “Pois bem, não é”, sentenciou. “Anistia é o sistema que temos hoje, no qual milhões de pessoas que vivem aqui não pagam impostos ou não estão em dia com a lei, enquanto os políticos usam o assunto para assustar as pessoas e ganhar votos nas eleições”. “Esta é a verdadeira anistia: deixar o sistema como está, arruinado”, continuou, dominando já a audiência que às portas da Casa Branca lhe agradecia com cartazes. “A anistia geral seria injusta. A deportação total seria ao mesmo tempo impossível e contrária a nosso caráter de nação. O que estou descrevendo é responsabilidade, abordar o tema com bom senso e chegando a um meio termo: se você atende aos critérios, pode sair das sombras e ficar dentro da lei. Se é criminoso, será deportado. E saiba que se está pensando em entrar nos EUA ilegalmente, aumentaram as possibilidades de que seja preso e enviado de volta”. Se Obama fosse um homem do Exército, a moral da história seria: “Senhores republicanos, vocês se meteram com o marine (fuzileiro naval) errado”.
“É uma alegria, uma emoção, uma felicidade, estamos muito agradecidos ao presidente Obama”, destacou este guatemalteco “orgulhosamente” que “como milhões” de pessoas vive sem documentos no país e espera poder beneficiar-se da ação executiva decretada pelo governante democrata devido à falta de ação no Congresso.
Com ele, cerca de uma centena de imigrantes e ativistas foram para a frente da residência de Obama para comemorar o anúncio que esperavam há anos. A mensagem estava resumida em cartazes agitados entre gritos de “Sim, nós podemos!” e “Conseguimos!”. “Obrigado, presidente Obama”, era a mensagem unânime dos cartazes. “Nos sentimos lisonjeados e agradecemos ao presidente. Esperamos por tanto tempo!”, exclamava Nelson, um salvadorenho que conseguiu a cidadania há apenas um mês, mas quis ir à Casa Branca para demonstrar solidariedade a tantos compatriotas que ainda esperam seus papéis.
Tanto ele como Hernández têm consciência de que as medidas de Obama não são mais do que um paliativo e que a verdadeira ação deve ser produzida no Congresso, o único capaz de redigir uma lei migratória integral.
Assim também se expressava pelas redes sociais alguém que pode ter de finalizar o caminho aberto agora por Obama, sua ex-secretária de Estado e potencial candidata presidencial democrata Hillary Clinton.
“Obrigada Potus (acrônimo de presidente dos EUA, em inglês) por tomar a ação frente à inação. Agora é tempo de uma reforma permanente bipartidário”, disse Clinton, no Twitter. Da Casa Branca, os ativistas prometiam que também continuarão “na luta” até que o Congresso reaja. “Mas, pelo menos esta noite, vamos comemorar”, afirmou Nelson.
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“Quando cheguei à Casa Branca me comprometi a consertar o sistema”, disse Obama, que abriu a narrativa referindo-se à segurança da fronteira, para, já de entrada, neutralizar aqueles que acreditam que a palavra “imigrante” só rima com “delinquência”. “Durante os últimos seis anos, as entradas ilegais diminuíram pela metade”, informou o homem que já foi chamado pelos ativistas pró-imigração de “deportador chefe”. Nesse ponto, Obama fez uma referência à grave crise humanitária vivida na fronteira no verão passado após a chegada aos Estados Unidos de milhares de menores de idade desacompanhados.
“No entanto, o número de pessoas que tenta cruzar a fronteira de maneira ilegal se encontra hoje em seu nível mais baixo desde a década de setenta”, destacou Obama. Recorrendo então a seus dotes mais didáticos, propiciando um “crescendo” e após declarar que o Congresso tinha se tornado um muro intransponível para sua ambiciosa lei de reforma – que teria aberto as portas para a legalização de milhões de indocumentados – , Obama afirmou que, como presidente, tem a autoridade para adotar medidas executivas e que é isso o que vai fazer.
“Primeiramente, continuaremos equipando a fronteira com mais recursos”. “Em segundo lugar, será mais simples para os imigrantes com estudos, empresários e pessoas de alto perfil permanecerem e contribuírem com nossa economia”. “Em terceiro lugar, daremos os passos necessários para tratar de maneira responsável os milhões de imigrantes ilegais que já vivem no nosso país”.
O terceiro ponto foi aquele que o presidente quis estender. Foi esse o assunto que o fez se transformar, de repente, no professor Obama. Apesar de antes de fazê-lo ter vestido a roupa de um homem de consenso e recordar as palavras que outro político que já ocupou o mesmo cargo costumava dizer em relação aos imigrantes que tornam possível o dia-a-dia dos Estados Unidos. “Como disse uma vez meu antecessor, o presidente Bush: ‘Eles são parte da vida americana’”. Obama descreveu o núcleo de sua ação executiva desta maneira: “Se você já está nos EUA há mais de cinco anos; se você tem filhos que são cidadãos americanos ou residentes legais; se você se registrar, passar por um controle de antecedentes criminais e estiver disposto a pagar uma parte justa dos impostos que deve; você poderá permanecer neste país temporariamente, sem medo de ser deportado. Você pode sair das sombras e fazer as pazes com a lei”.
"Sei que muitos daqueles que criticam a medida que estou tomando a chamam de anistia. Pois bem, não é"Barack Obama
“As ações que estou tomando não só são legais como são o tipo de medida adotada por cada presidente republicano e cada presidente democrata durante o último meio século. E para os membros do Congresso que questionam minha autoridade para fazer com que nosso sistema de imigração funcione melhor, ou questione meu julgamento de agir onde o Congresso falhou, tenho uma resposta: ‘Aprovem uma lei’”.
Tudo estava dito. Obama acabava de jogar a bola para o campo republicano. Tinha movido as peças. Tinha se rebelado diante da inação e até perguntou se, por acaso, os EUA não seriam uma nação que tolera a hipocrisia, deixando que trabalhadores ilegais colham frutos e arrumem as camas enquanto se olha para o outro lado.
“Sei que muitos dos que criticam a ação que estou tomando chamam isso de anistia”, disse o presidente. “Pois bem, não é”, sentenciou. “Anistia é o sistema que temos hoje, no qual milhões de pessoas que vivem aqui não pagam impostos ou não estão em dia com a lei, enquanto os políticos usam o assunto para assustar as pessoas e ganhar votos nas eleições”. “Esta é a verdadeira anistia: deixar o sistema como está, arruinado”, continuou, dominando já a audiência que às portas da Casa Branca lhe agradecia com cartazes. “A anistia geral seria injusta. A deportação total seria ao mesmo tempo impossível e contrária a nosso caráter de nação. O que estou descrevendo é responsabilidade, abordar o tema com bom senso e chegando a um meio termo: se você atende aos critérios, pode sair das sombras e ficar dentro da lei. Se é criminoso, será deportado. E saiba que se está pensando em entrar nos EUA ilegalmente, aumentaram as possibilidades de que seja preso e enviado de volta”. Se Obama fosse um homem do Exército, a moral da história seria: “Senhores republicanos, vocês se meteram com o marine (fuzileiro naval) errado”.
“Obrigado, presidente Obama”
S. Ayuso
O sorriso não cabia no rosto de Henry Hernández na noite de
quinta-feira. Apesar do frio intenso, ele permaneceu postado à frente da
Casa Branca enquanto o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama,
anunciava as medidas executivas que regularizarão temporariamente quase 5
milhões de pessoas sem documentos. Entre suas mãos enluvadas segurava
uma bandeira norte-americana e uma vela.“É uma alegria, uma emoção, uma felicidade, estamos muito agradecidos ao presidente Obama”, destacou este guatemalteco “orgulhosamente” que “como milhões” de pessoas vive sem documentos no país e espera poder beneficiar-se da ação executiva decretada pelo governante democrata devido à falta de ação no Congresso.
Com ele, cerca de uma centena de imigrantes e ativistas foram para a frente da residência de Obama para comemorar o anúncio que esperavam há anos. A mensagem estava resumida em cartazes agitados entre gritos de “Sim, nós podemos!” e “Conseguimos!”. “Obrigado, presidente Obama”, era a mensagem unânime dos cartazes. “Nos sentimos lisonjeados e agradecemos ao presidente. Esperamos por tanto tempo!”, exclamava Nelson, um salvadorenho que conseguiu a cidadania há apenas um mês, mas quis ir à Casa Branca para demonstrar solidariedade a tantos compatriotas que ainda esperam seus papéis.
Tanto ele como Hernández têm consciência de que as medidas de Obama não são mais do que um paliativo e que a verdadeira ação deve ser produzida no Congresso, o único capaz de redigir uma lei migratória integral.
Assim também se expressava pelas redes sociais alguém que pode ter de finalizar o caminho aberto agora por Obama, sua ex-secretária de Estado e potencial candidata presidencial democrata Hillary Clinton.
“Obrigada Potus (acrônimo de presidente dos EUA, em inglês) por tomar a ação frente à inação. Agora é tempo de uma reforma permanente bipartidário”, disse Clinton, no Twitter. Da Casa Branca, os ativistas prometiam que também continuarão “na luta” até que o Congresso reaja. “Mas, pelo menos esta noite, vamos comemorar”, afirmou Nelson.