A BBC Brasil entrevistou o jornalista Ricardo Kotscho, ex-assessor de imprensa do governo Lula, sobre o confronto entre a velha mídia e a campanha da Dilma. Kotscho tem visão lúcida, bem distante daquela dos coleguinhas que repetem os patrões. Diz, por exemplo, que nunca houve tanta liberdade de imprensa no país, o que é óbvio, mas precisa ser repetido, porque o pig (partido da imprensa golpista) vende a ideia de que Lula quer censurá-lo. Mas se atrapalha quando diz que a liberdade está sendo mal usada. Não se trata disso, trata-se de que a propriedade e as concessões dos meios de comunicação no Brasil estão concentradas nas mãos de pouquíssimos reacionários. Nenhuma nação pode dar a um grupo esse poder – a Inglaterra da BBC, por exemplo, não dá, assim como os EUA. É preciso democratizar a comunicação. É claro que o direito de resposta precisa funcionar, mas isso não é um problema de imprensa, é de justiça: no Brasil a justiça só funciona para os ricos, para os outros é lenta e injusta. Kotscho não quer cuspir no prato em que comeu e fica em cima do muro; defende o governo Lula, mas preserva o moribundo pig.
Briga entre governo e mídia é ruim para todos, diz Ricardo Kotscho
BBC Brasil- A reta final da campanha eleitoral foi fortemente marcada pelo confronto entre o governo do presidente Lula e a imprensa. O senhor, que fez uma carreira como jornalista investigativo e, por outro lado, trabalhou com o governo, o que diria? É possível ser imparcial nesse debate?
Ricardo Kotscho - Sempre se discute a neutralidade do jornalismo, a imparcialidade do jornalismo. Eu não acredito nesses chavões, a grande imprensa sempre diz isso, que eles são imparciais. A partir do momento em que a Dilma disparou nas pesquisas e todos os institutos mostraram que ela pode ser eleita no primeiro turno, a impressão que me dá é que bateu um desespero, tanto na campanha da oposição, que radicalizou no discurso, quanto na mídia. E no Brasil hoje, a grande mídia, a velha mídia, ela se confunde... você não sabe onde termina o Jornal Nacional e onde começa a campanha do Serra. Acho que virou uma questão pessoal dos jornalistas e dos donos dos meios de comunicação com o Lula. Eles simplesmente não admitem que Lula tenha sido eleito, reeleito e agora esteja fazendo um sucessor. Nesta semana, tive uma conversa com o presidente Lula e disse a ele que achava que ele não deveria entrar nessa guerra, não deveria falar da imprensa, deveria esquecer a imprensa. Os dois lados estão errados, acho que o presidente da República não tem que ficar todo dia falando da imprensa, criticando a imprensa. E, do outro lado, a imprensa não pode ser um partido político, agir como um partido político, que é o que está acontecendo. Nesta semana, houve dois atos públicos em São Paulo. Um em defesa da democracia, da liberdade de imprensa, como se a liberdade de imprensa estivesse ameaçada, e outro, no Sindicato dos Jornalistas (de São Paulo), uma manifestação dos partidos aliados do governo e do movimento sindical, contra o golpismo midiático, contra esses órgãos de imprensa que estão fazendo campanha a favor do Serra e contra a Dilma. Este é o momento que estamos vivendo agora. Eu não gosto disso, acho que não é bom para o país, não é bom para a democracia brasileira. Mas não é como alguns tentam fazer parecer, que estamos à beira de uma guerra civil, que a democracia está ameaçada, isso não existe. A liberdade de imprensa não está ameaçada. Você pega qualquer veículo, liga qualquer TV, ouve qualquer rádio, nunca tivemos tanta liberdade quanto temos hoje. Eu acho que essa liberdade está sendo abusada, mal usada.
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