Só conheço dele o que li abaixo e detesto barulho, que é o que mais tem em Belo Horizonte, hoje, a qualquer hora da noite e da madrugada, sem qualquer fiscalização, a começar por carros e construção civil, além de festas em edifícios, mas os argumentos desta petição são fortes. A campanha contra o Espaço Fluxo parece ser mais um lance da higienização de Belo Horizonte. Não é um fenômeno local nem nacional, é mundial, como mostram inúmeros filmes recentes, entre eles o belo "O porto" (Le Havre), em cartaz no Belas Artes. A urbanização acelerada, as migrações e a decomposição social do capitalismo tornam cidades contemporâneas caldeirões de culturas diversas, nos quais convivem desconhecidos que tentam se ignorar uns aos outros e viver suas vidas particulares sem serem importunados. A intolerância com as diferenças se manifesta em explosões, reclamações, denúncias, violências. Afinal, os vizinhos nunca são convidados para as festas barulhentas que têm de suportar... São festas particulares. Se o vizinho fosse convidado, talvez se tornasse um amigo, em vez de um desconhecido. Se o vizinho fosse à festa ao lado, talvez ficasse feliz, em vez de adoecer em casa. Mas o padrão não é esse. A questão é que esse mundo de intolerância não vai mudar, se não mudarmos nossos comportamentos. As autoridades jogam no outro time -- basta ver a privatização dos espaços públicos pela prefeitura de Belo Horizonte na atual gestão -- e sua polícia é truculenta. Feliz da sociedade que tem artistas e jovens com coragem para resistir.
Petição de Apoio ao Espaço Fluxo
Para: Secretaria de Cultura; Conselho Municipal de Cultura; Prefeitura de Belo Horizonte.
Imaginem um centro cultural que desenvolve e apoia uma série de inciativas locais e que atua, de forma criativa e aberta, em vários flancos, promovendo a música, as artes plásticas, a poesia e a gastronomia, além de encontros entre as diferentes formas de expressão artística e também entre pessoas, entre ideias. Agora, peço-lhes que empreendam o desagradável exercício de tentar converter esse espaço e essas iniciativas em um perigo moral iminente, em uma ameaça, em um despautério, em uma afronta. Parece difícil?
Infelizmente não é, pelo menos algumas pessoas. Todos temos em nossas mentes uma série de apriorismos, de desinformações prontas, que recebemos passivamente em algum momento de nossas vidas sem perceber; refugo que está ali e ponto. Por vezes, nossos apriorismos encontram-se tão arraigados que se tornam quase estruturais, basilares. Se não tomarmos cuidado, podemos construir toda a nossa personalidade e nossa escala de valores com base em ideia cujas origens desconhecemos e que têm a força racional de uma simples frase feita que não pode e não carece ser explicada; de um aforisma retumbante e vazio.
A íntegra.
A petição
Abaixo assino que o manifesto que narra descritivamente as atrocidades enfrentadas no percurso de nove meses de instalação do Espaço Fluxo {espaço destinado à fruição de atividades artísticas} é um texto que representa minha indignação.
Trabalhadores da revolução cotidiana > MULTIPLICAI-VOS
Construtores dos alicerces da cultura > AGLOMERAI-VOS
SOBRE O QUE FAZEMOS:
- Fazemos do absurdo o nosso terreno a fim de erguer uma casa que abrigue múltiplos processos
- Reafirmamos o hibridismo e mestiçagem para contribuir com a difusão da identidade brasileira
- Dispensamos os automatismos da individualidade para somar em um corpo-coletivo a resistência frente as demandas cruéis de um sistema vigente de arte
- Compreendemos com prazer nosso dever de responsabilidade social e esclarecimento frente aos dispositivos malignos do poder
- Acordamos diariamente para a devida contribuição no desenho da nossa geração com a arte que transforma a realidade
- Acreditamos na troca de saberes como mecanismo eficiente da educação brasileira
- Afirmamos a fruição do processo como ferramenta de compreensão da arte e desenvolvimento de indivíduos mais críticos
- Fazemos do pensamento exercício diário e vital para a revolução diária na legitimação de uma nova realidade cultural em nosso país
O QUE COMBATEMOS PELO QUE FAZEMOS:
- Indivíduos hostis, dotados de desinteresse em questões culturais e na transformação da sociedade
- Coletivo de indivíduos com discursos esvaziados, preconceituosos, sem fundamento algum.
- Abuso de suposto poder e constantes ameaças sob o uso de discursos inflamados.
- Desinteresse em compreender ou ao menos conhecer o projeto a que se destinam tais críticas.
- Violência verbal e física em função da situação geográfica da casa (ovos!)
- Uma vizinhança que se camufla no breu do anonimato para exercer a revelia da violência, uma crueldade socialmente localizada.
- Ainda uma vizinhança pequeno-burguesa que temerosa ao público indiscriminado {freqüentador do espaço fluxo} quer se apropriar dos espaços públicos, ainda do inteiro bairro Santa Tereza para fundar os quintais de suas propriedades burguesas e pior: particulares.
DELICADAMENTE,
Mariana de Matos.
Espaço Fluxo
Os signatários
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