O economista Delfim Netto, o todo poderoso ministro da ditadura militar, é capaz de analisar criticamente os governos do PT sem cair na vala comum da direita protofascista, que vive em simbiose com a "grande" imprensa (Globo, Veja, Folha e Estadão), escrevendo o que
ela quer publicar e sendo promovida por ela. Por isso ficou restrito à Carta Capital e eventualmente ao jornal Valor. Neste artigo, ele trata da transição demográfica brasileira (estabilização e envelhecimento da população, decorrentes da queda do número de filhos e da longevidade), um problema fundamental para o planejamento econômico. Os números de Delfim estão errados, como se vê em notícia publicada em outubro; eles são mais urgentes. Mas o artigo é interessante. Apesar da sua moderação, o veterano economista é um conservador, prisioneiro do pensamento capitalista, que pressupõe crescimento econômico permanente. Nunca é demais dizer que se prega tanto o crescimento econômico porque ele é sinônimo de lucro, que é a essência do capital: capital só é capital se aumenta continuamente. Há outra forma de produzir riqueza sem crescimento: basta distribuí-la. A humanidade produz riqueza suficiente para que vivamos todos em condições fantásticas, como jamais viveu geração alguma antes, só que é preciso distribuir a riqueza, que é extremamente concentrada e fica ainda mais nas crises, quando o receituário conservador manda cortar gastos sociais e investimentos; o resultado disso, obviamente, é que o número de pobres aumenta e o número de ricos diminui, os pobres ficam mais pobres e os ricos mais ricos. Delfim, que no passado pregava que era preciso "fazer o bolo crescer para depois reparti-lo", reviu sua posição e agora acha que é possível fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Não é -- não porque não é possível repartir, mas porque não é possível mais crescer como o capitalismo quer. É o planeta que está entrando em colapso e só temos ele para explorar. O que é preciso fazer é distribuir as riquezas e melhorar a qualidade de vida para todos em todas as partes do planeta, mas isso não é mais capitalismo. Basta pensar no tempo que gastamos trabalhando atualmente, apesar de tanta tecnologia, criada justamente para nos livrar do trabalho. No capitalismo, no entanto, a tecnologia é posta a serviço do aumento do lucro, não a serviço da diminuição do trabalho.
Da Carta Capital.
Quando menos é mais
Delfim Netto
O Brasil vive hoje uma revolução econômica e ao mesmo tempo uma revolução demográfica, não muito comentadas. Da econômica todos falam, bem ou mal: se crescemos menos de 1% de um trimestre a outro, o tema vira manchete na imprensa (escrita ou virtual). E só é substituído quando se "revela" que, por causa do baixo crescimento em 2012, a Inglaterra retomou a posição de sexta economia mundial, nossa por uns poucos meses…
Na revolução demográfica há sinais tão importantes quanto na outra, que nos ajudariam a pensar o Brasil que gostaríamos de legar para a geração a amadurecer em 2030. São fatos já inscritos que com toda a probabilidade se realizarão, a não ser que sejamos atropelados por uma improvável invasão marciana.
Essa revolução deve-se basicamente ao processo civilizatório felizmente alcançado pela mulher brasileira, que hoje estuda mais, gera menos filhos (e um pouco mais tarde) e aumenta sua participação na força de trabalho. Há menos de quatro décadas temia-se que o Brasil, com sua então fantástica taxa de fecundidade, estaria condenado a ser um país miserável.
A íntegra.