sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

A obra de arte mais significativa do século XXI

Vik Muniz é mesmo um artista extraordinário. Não é só galeria de arte que ele lota, lota também salas de cinema. A sessão popular de ontem do Belas Artes estava com a sala cheia. Em 2007, o paulista Vik Muniz, um dos mais bem pagos, celebrados e populares artistas plásticos contemporâneos, decidiu realizar um trabalho que revertesse em ganho e transformação na vida de pessoas excluídas pelo sistema. Escolheu como local o lixão do Rio de Janeiro. Saiu de Nova York, onde vive, e foi pro Rio, entrou no lixão, conviveu com os catadores, escolheu suas personagens, criou suas obras, feita com material reciclável e que os próprios trabalhadores executaram. Depois levou um quadro para ser leiloado em Londres e o dinheiro foi destinado à Associação dos Catadores. Voltou ao Rio e reencontrou aquelas pessoas, depois da experiência, que levou dois anos. E filmou tudo isso, que foi transformado no documentário Lixo extraordinário, selecionado para concorrer ao Oscar 2011. O filme é ótimo, a experiência vivida pelos catadores lhes foi benéfica, e a arte moderna de Vik ganha significado. Vik Muniz se torna um grande artista quando entra no lixão para criar. O documentário é uma aula de arte, que por sua vez tem sentido por nos revelar nossa realidade. Quando vemos o lixão, nossa tendência é fechar os olhos e considerar aqueles indivíduos lixo também. No entanto, são seres humanos como quaisquer outros, trabalhando para sobreviver. As personagens escolhidas por Vik Muniz, mergulhadas no lixão, são seres humanos de primeira. Nós, que produzimos lixo e nos livramos dele, sem considerar para onde vai e o que acontece com ele, é que não valemos muito. Não é assim à toa. A sociedade de consumo foi programada pelo capital para movimentar a economia e gerar lucro. Consumimos muito mais do que precisamos, e consumimos lixo (comida ruim, plásticos, descartáveis de todos os tipos), por isso somos obesos e sofremos as doenças da obesidade. Essa produção vertiginosa de lixo é embelezada pela ideia de que o novo é melhor, o que justifica a pouca durabilidade dos produtos e nossa ânsia de consumo, a principal fonte de "felicidade" no mundo contemporâneo. É óbvio que não pode ser assim durante muito tempo, porque os recursos naturais são finitos, mas as gerações contemporâneas se esbaldam, transformando o mundo inteiro num lixão, no qual viverão nossos descendentes. Não pode haver obra de arte mais significativa em 2011 do que a criada a partir do lixo.