quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

Dilma, os rentistas e a infraestrutura

Brasil tem minério de ferro para quatro séculos, mas a Vale não quer transformá-lo em trilhos para ferrovias, prefere exportá-lo. Resultado: o Brasil vende minério para a China e compra trilhos, sete vezes mais caros. Até o governo FHC a CSN produzia trilhos, mas os tucanos desativaram a laminação e fizeram o Brasil voltar aos anos 1940, quando exportava minério e importava aço. Em seguida, FHC deu a Vale e outras grandes empresas para a iniciativa privada multinacional. O Brasil perdeu o controle sobre a infraestrutura, que falta agora, quando cresce. E os tucanos vão fazer campanha em 2014 batendo na tecla desse "gargalo" da infraestrutura. Criado por eles. E têm a "grande" imprensa com eles. E os rentistas. E as multinacionais. Assim o círculo de interesses econômicos se fecha, unindo exportadores de produtos primários, rentistas, imprensa e políticos tucanos. 
Governos do PT e do PSDB se opõem porque têm duas visões de mundo opostas. Os tucanos acham que o Brasil não tem que ter projeto próprio, tem que se diluir na globalização, que o capitalismo é um só, que não faz diferença se a empresa é nacional ou estrangeira, que o Brasil deve colaborar com o que tem de melhor, minérios, soja e café, e importar o que outros países produzem. O Estado não tem que se meter nessa história, deve só facilitar a vida dos empresários. E o restante da população, os 99,99% de trabalhadores? Que se virem, que se qualifiquem, conquistem salários melhores etc., nesse grande jogo que é o mercado. É uma corrente política tão antiga que nem a ditadura a seguia, a gente tem de voltar à República Velha para vê-la em ação. Corrente política que foi embora com a crise de 1929 e com a Revolução de 1930 -- e voltou com Collor e FHC.
O PT segue a linha inaugurada por Getúlio, seguida por JK e governos seguintes, inclusive os militares, com variações, a política do desenvolvimentismo, em que o Estado e iniciativa privada atuam juntos, os empresários, especialmente os empreiteiros, ganham muito dinheiro, mas há um plano nacional a ser seguido e o governo está no comando, inclusive atuando com empresas estatais estratégicas. A Petrobrás é uma dessas, a Vale seria outra, mas a Vale foi privatizada. Podemos imaginar o que seria do País se FHC tivesse conseguido dar a Petrobrás também (chegou a mudar seu nome para Petrobrax). Aconteceria com o pré-sal o que está acontecendo com o minério de Carajás, que a Vale explora segundo seus interesses sem se preocupar com o que é bom ou ruim para o Brasil. Mais que isso: contra os interesses do País, servindo a meia dúzia de acionistas. 
A Vale precisa ser reestatizada.

Da Agência Carta Maior.
Pratos cuspidos e trilhos entalados
Por Saul Leblon
O governo vai em romaria aos grandes centros financeiros mundiais para atrair investidores interessados em construir ferrovias, estradas, portos e aeroportos no país.
Não é um passeio. Pode ser uma cartada decisiva.
A continuidade do desenvolvimento requer algo em torno de R$ 500 bilhões em investimentos para dilatar a fronteira logística de um sistema econômico originalmente projetado para servir a 30% da sociedade.
O Brasil corre contra o tempo, mas o momento é favorável.
O governo oferece projetos de concessão pré-esquadrejados pelo Estado.
O interesse público define as prioridades , prazos, qualidade do serviço e taxas de retorno – atraentes, diga-se, de até 15% ao ano.
Num mundo estagnado pela desordem neoliberal, com juro negativo e dinheiro embolorando no caixa das corporações, pode dar certo.
Mas a romaria que começa nesta sexta-feira não visa apenas ao capital externo.
Na verdade, destina-se também a desfechar um safanão no rentismo local.
Em 2012 ele já fora abalroado por um corte de 5,5 pontos na taxa da Selic.
Dilma roçou baixo o pasto gordo da renda fixa, livre, leve e líquida propiciada pelos títulos públicos.
Ainda assim a manada hesita.
Resiste em migrar dos piquetes de engorda de curto prazo para canteiros de obras de longo curso.
Mesmo com taxas de retorno maiores que a do juro real da dívida pública.
A relutância não é totalmente espontânea.
Anima-a a lira musical conservadora que sassarica dando voltas no salão, a embalar expectativas de que o Brasil de Dilma vai acabar na próxima curva.
A estratégia tem lógica.
Trata-se de engessar a economia em um imenso gargalo de infraestrutura, capaz de emprestar alguma relevância ao discurso do senhor Neves, em 2014.
O governo tenta contornar a arapuca trazendo a concorrência do investidor estrangeiro para atiçar o investimeto local.
Mas não é o único obstáculo que enfrenta.
O país que pretende construir 10 mil km de ferrovias nos próximos anos não dispõe de uma única fábrica de trilhos para atender a demanda prevista. 
Um capitalismo reflexo, rapinoso e imediatista, em que as coisas dão certo quando tudo dá certo.
Quando dá errado, como na crise de 2008, a Vale, de Agnelli, foi a primeira empresa brasileira a baixar o porrete grosso: demitiu 1.300 operários numa tacada.
A Petrobrás não demitiu ninguém. E engoliu um congelamento estratégico do preço da gasolina, martelado como escândalo pelo jornalismo especializado no direito dos acionistas graúdos.