Agora que a farsa do julgamento do "mensalão" chega ao fim, vale a pena reler o que escreveu há quase um ano o insuspeito historiador americano Kenneth Maxwell, professor do Departamento de História e diretor do Programa de Estudos
Brasileiros do Centro de Estudos Latino-Americanos (Drclas) da
Universidade de Harvard. Ele é autor de A Devassa da Devassa, obra publicada no Brasil em 1977 e que mudou a forma de se ver a Inconfidência Mineira. O segundo texto foi suprimido da revista Época (Globo) na internet, mas está copiado no blog Página do E.
PS: No julgamento, Joaquim Barbosa citou jurista para respaldar sua decisão, mas o jurista citado retrucou dizendo que o presidente do STF está errado...
Da Folha de S. Paulo.
A Alçada
Kenneth Maxwell
Em 17 de julho de 1790, a rainha Maria, de Portugal, estabeleceu um
tribunal itinerante especial, ou Alçada, para julgar os conspiradores de
Minas Gerais, detidos no Rio de Janeiro e em Minas, sem direito a
visitas desde a traição na Inconfidência Mineira, em 1789.
Os prisioneiros incluíam Joaquim José da Silva Xavier, alferes nos
Dragões de Minas e mais conhecido pelo apelido Tiradentes, e o
desembargador Tomás Antônio Gonzaga.
O chanceler indicado para o Tribunal de Relação do Rio de Janeiro,
desembargador Sebastião Xavier de Vasconcellos Coutinho, foi apontado
para presidir a Alçada, formada também por Antônio Gomes Ribeiro e
Antônio Diniz da Cruz e Silva, da Casa de Suplicação, que se juntaram a
ele em Lisboa.
O chanceler Vasconcellos Coutinho foi instruído a ignorar "qualquer
falta de formalidades [...] e invalidades judiciais [...] que possam
existir nas devassas, e considerar as provas de acordo com a lei
natural". A Alçada recebeu toda a autoridade necessária: "Não
obstante todas as outras leis, disposições, privilégios e ordens em
contrário, apenas para esta ocasião".
Ao final, Tiradentes foi sacrificado. E, se por acaso os processos da
Alçada começam a lhe parecer estranhamente semelhantes com o mensalão,
isso não deveria causar surpresa: de fato, são. Algumas coisas nunca
mudam.
A íntegra.
Da revista Época.
Poderosos e "poderosos" no mensalão
Paulo Moreira Leite
Kenneth Maxwell, historiador respeitado do Brasil colonial, compara o julgamento do mensalão ao Tribunal que julgou a inconfidência mineira. Não, a questão não é perguntar sobre Tiradentes. Mas sobre Maria I, a louca e poderosa. Tanto lá como cá, diz Maxwell, tivemos condenações sem provas objetivas. Primeiro, a Coroa mandou todo mundo a julgamento. Depois, com uma ordem secreta, determinou que todos tivessem a vida poupada – menos Tiradentes.
Poderoso é quem faz isso.
Escolhe quem vai para a forca.
"Poderoso" pode ir para a forca, quando entra em conflito com sem aspas.
Genoíno, Dirceu e os outros eram pessoas importantes – e até muito importantes – num governo que foi capaz de abrir uma pequena brecha num sistema de poder estabelecido no país há séculos.
O poder que eles representam é o do voto. Tem duração limitada, quatro anos, é frágil, mas é o único poder para quem não tem poder de verdade e depende de uma vontade, apenas uma: a decisão soberana do povo.
A íntegra.