"- Mas, enfim, o que querem os nossos dois partidos?...
- A cauda de qualquer dos dois não sabe, nem se ocupa de saber o que quer, já o disse uma vez.
- E o corpo?...
- O corpo de um proclama que quer conservar, bem que vá, pelo sim pelo não, destruindo muita coisa boa; e o corpo do outro assevera que quer progredir. Os conservadores
dizem que não admitem o progresso político, porque temem que ele nos
atire além dos limites da prudência; os progressistas repelem os erros
do passado; sustentam que o sistema monárquico-representativo está
falseado entre nós, que é indispensável apelar para diversas reformas
políticas, se quisermos que a monarquia constitucional seja no Brasil
uma realidade: uns e outros, conservadores e progressistas, dizem ainda
muita coisa, mas o essencial é isso.
- E uma vez por todas, a cabeça o que quer?... o que querem os chefes?...
-
Os chefes?... outra vez, com exceção de alguns homens sinceros e
dedicados, que todos respeitam, os chefes de um dos partidos se dizem
também conservadores, e na verdade que o são, debaixo de certo ponto de vista, porque, quando estão no poder, tratam de conservar-se
nele a todo custo e por todos os meios; e os do outro dizem-se também
progressistas, e eu não duvido que o sejam, porque quando estão debaixo
caminham para adiante com toda a pressa que podem, a ver se nesse progresso chegam ao poder; mas o que é verdade, o que todos veem, é que esses conservadores, logo que se acham no governo, andam para trás como caranguejos, ou oprimem o país como pesadelos; e estes progressistas ocupando o timão do Estado desenvolvem e mostram um tal progresso de preguiça que chegam até a subir e descer sem jamais sair de um mesmo lugar!
- Portanto...
-
Portanto, entre os chefes dos dois partidos, com exceção, repito, dos
poucos que são sinceros e dedicados, não há luta pelas ideias, há briga
por causa do poleiro: os princípios políticos deles são idênticos,
porque se resumem, como já disse, no pronome -- Eu -- e quer subam uns,
quer subam outros, a coisa anda, pouco mais ou menos, do mesmo modo."
(Do livro A carteira de meu tio, de Joaquim Manuel de Macedo.)