De vez em quando é bom ler uma publicação antiga. Nos faz ver como a "grande" imprensa já foi melhor. Nesta, Veja, além de informar (o que não faz mais, desde que se tornou um 
panfleto político-partidário contra o PT 
e Lula, especialmente), critica quem hoje ela só idolatra: Azeredo, o deputado da direita encarregado de criar a lei de censura à internet, quinze anos atrás era o governador "bobo", "medroso", "incompetente", que manda 
"quem
        está em cima chicotear o lombo de quem está embaixo". Esta Veja de 1997 dizia, por exemplo, que a Rotam mineira imitava os "métodos bárbaros" da Rota paulista -- hoje, quando a PM de Alckmin e Kassab invade campus universitário e desaloja sem casa, além de cometer 
outros crimes, a revista não a condena mais. Em 97, diz a matéria, os policiais tinham "orgulho de vestir a farda" e eram "populares". Embora, durante o governo FHC, soldados e cabos da PM recebessem soldos que "beiram o inacreditável".  Enfim, nada como reler velhas revistas e jornais para ver como as coisas mudam. 
Do saite da Editora Abril.  
Lições de uma greve selvagem 
Governador de Minas
        Gerais se rendeu e 
        a PM já fala em parar nos outros Estados 
Joaquim de
        Carvalho e Marcos Gusmão, de Belo Horizonte
            
                |  | Azeredo: o esperto fez
                papel de bobo | 
A greve da Polícia Militar de
        Minas Gerais terminou na noite de quinta-feira passada
        com dois ensinamentos. O primeiro diz respeito aos
        governadores: o tucano Eduardo Azeredo quis ser tão
        esperto que acabou fazendo papel de bobo. No início do
        mês passado, representantes dos 42.000 homens da
        Polícia Militar manifestaram insatisfação com o
        salário. Em vez de negociar e barganhar, Azeredo baixou
        uma proposta única: reajuste de 11% para oficiais que
        embolsam até 6.000 reais por mês e nada para soldados,
        cabos e sargentos, que chegam a receber 410 reais, ou
        quase quinze vezes menos. A esperteza de Azeredo produziu
        uma greve selvagem numa PM considerada modelo e descambou
        na mais funda crise política do Estado desde 1964,
        obrigando tropas do Exército a desfilar pela capital com
        tanques e veículos militares. Antes da greve, Azeredo
        poderia ter feito um acordo em torno dos mesmos 11% que
        ofereceu aos oficiais. Quando o movimento se iniciou, ele
        chegou a oferecer 20%. Na quinta-feira passada, quando
        enfim conseguiu encerrar a paralisação, Azeredo foi
        obrigado a pagar um aumento de 48% -- quatro vezes a
        inflação do último ano, a maior vitória que qualquer
        categoria de trabalhador, funcionário público ou não,
        paisano ou não, já obteve desde o lançamento do Plano
        Real, três anos atrás. 
            
                | 
Sonho
                de infância Acusado de ter atirado
                no cabo Valério, o soldado Wedson Campos Gomes,
                de 30 anos, foi carcereiro antes de entrar na PM.
                "Desde menino, falava em ser policial, para
                correr atrás de bandido", afirma sua mãe.
                Um irmão, também PM, suicidou-se em 1990.
                Solteiro, mora com a mãe e quatro irmãos.
                Apesar da evidência das imagens de TV, diz que
                atirou para o alto e não acertou o cabo | 
O segundo exemplo diz respeito
        à PM de outros Estados e interessa diretamente às
        pessoas que necessitam de seus serviços -- isto é, ao
        cidadão comum. A greve de Minas mostrou como é fácil
        dobrar governadores que não têm uma política de
        segurança pública e acham confortável mandar quem
        está em cima chicotear o lombo de quem está embaixo. Se
        o governador do seu Estado está nessa categoria,
        prepare-se: pode estar vindo confusão por aí. A
        Associação dos Cabos e Soldados de Pernambuco marcou
        para o dia 12 de julho a primeira assembléia de
        militares em 172 anos de existência da PM estadual.
        "A vitória de Minas serviu de exemplo. Soldado
        dentro de quartel reclamando da vida não consegue
        aumento", diz o cabo Renato Ribeiro, coordenador da
        associação. (...)
No Palácio do Planalto, a
        partir do que aconteceu em Minas Gerais, tem-se como
        certo que as ameaças das associações de diferentes
        Estados não são bravatas. Os soldos de soldados e cabos
        das PM beiram o inacreditável. Na melhor das
        hipóteses, são um convite à vagabundagem. Na pior, ao
        delito puro e simples. Em 1995, segundo o próprio
        presidente da Associação de Cabos e Soldados de São
        Paulo, 112 PMs foram presos por ter-se misturado além da
        conta ao mundo da marginalidade, que deveriam combater.
        Em 1997, esse número aumentou para 282. Em 65% dos
        casos, os crimes cometidos foram assalto, roubo ou
        latrocínio. Some-se à desmotivação das tropas a
        desmoralização dos comandos e o gatilho está armado.
        "Esse risco de fato existe, e eu aviso aos meus
        colegas que liguem os sensores para detectar movimentos
        em quartéis e evitar que aconteça lá o que,
        infelizmente, ocorreu aqui", diz Azeredo, que,
        durante a paralisação, só manteve um sensor ligado --
        o do oportunismo político, pois passou a greve escondido
        da população, com medo de associar sua imagem ao
        sangue, à violência e à baderna promovida pela PM
        rebelada. 
            
                | 
Líder
                muambeiro Júlio César Gomes, de
                27 anos, cabo da PM, é o líder do movimento.
                Com 2º grau completo, recebe salário bruto de
                470 reais. Casado, tem três filhos. Nem vendendo
                mercadoria do Paraguai consegue colocar em dia a
                prestação de seu apartamento, cinco meses
                atrasada. Obreiro da Igreja Metodista, foi
                afastado das ruas há dois meses, por ter atirado
                num homem suspeito de tráfico de drogas | 
Colchões queimados --
        O que aconteceu em Minas mostra como essas coisas são
        bruscas. Vinte e quatro horas depois de o governador
        anunciar o aumento para os chefes, ocorreu o primeiro ato
        de rebeldia dos chefiados -- dois colchões foram
        queimados num dos dormitórios do batalhão de choque. No
        dia seguinte, 700 policiais marcharam até a porta do
        Palácio da Liberdade, sede do governo mineiro. De costas
        para o palácio, cantaram o Hino Nacional e se
        ajoelharam para rezar o Pai Nosso. Com a passeata,
        forçaram a negociação e, oito dias depois, receberam a
        oferta de um abono fixo de 102 reais, o que significaria
        21% de aumento para os salários mais baixos. Na
        terça-feira passada, numa assembléia em que, no lugar
        de bandeiras, portavam revólveres, eles rejeitaram a
        proposta e partiram para uma nova marcha em direção ao
        palácio. A passeata começou com cerca de 2.000
        policiais e terminou com 4.000, engrossada pelos
        militares que ainda trabalhavam nas ruas e abandonaram
        seus postos e por cerca de 700 investigadores da Polícia
        Civil. 
Na porta do palácio,
        encontraram barreiras formadas por militares recrutados
        de pelotões do interior ainda leais ao governo. Eles
        usavam braçadeira branca no braço e estavam ali para
        impedir a passagem dos manifestantes. Não conseguiram.
        Quando os amotinados se preparavam para entrar no prédio
        do comando militar, o cabo Valério dos Santos Oliveira,
        de 36 anos, subiu numa mureta para pedir calma aos
        colegas. "Calma, calma, pode haver tiros."
        Instantes depois, estava jogado no chão, atingido por um
        tiro disparado pelo soldado Wedson Campos Gomes, de 30
        anos, que, à paisana, se encontrava entre os
        manifestantes. O cabo Valério permanecia em estado de
        coma na sexta-feira da semana passada, no hospital João
        XXIII. Os policais desistiram da invasão, mas
        permaneceram em greve. 
 (...) Na quinta-feira à noite,
        aconteceu a rendição de Azeredo, que elevou para 200
        reais o abono fixo. A greve acabou. "O aumento que
        dei foi um gesto de humildade. Precisei fazer esse
        sacrifício para evitar um banho de sangue, que, segundo
        informações que recebemos, ocorreria na
        sexta-feira", justificou Azeredo, tentando
        transformar uma derrota acachapante num ato de grandeza
        política. Com o aumento, o governo terá de desembolsar
        340 milhões de reais a mais por ano com a folha de
        pagamento, que hoje já absorve 77% da receita. Mas não
        é esse o preço maior de sua incompetência, e sim o
        tremendo desgaste da autoridade no Estado -- mercadoria
        de valor difícil de calcular, como demonstram algumas
        cenas da greve. (...)
(...) Na quinta-feira à noite,
        aconteceu a rendição de Azeredo, que elevou para 200
        reais o abono fixo. A greve acabou. "O aumento que
        dei foi um gesto de humildade. Precisei fazer esse
        sacrifício para evitar um banho de sangue, que, segundo
        informações que recebemos, ocorreria na
        sexta-feira", justificou Azeredo, tentando
        transformar uma derrota acachapante num ato de grandeza
        política. Com o aumento, o governo terá de desembolsar
        340 milhões de reais a mais por ano com a folha de
        pagamento, que hoje já absorve 77% da receita. Mas não
        é esse o preço maior de sua incompetência, e sim o
        tremendo desgaste da autoridade no Estado -- mercadoria
        de valor difícil de calcular, como demonstram algumas
        cenas da greve. (...) 
            
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Herança
                familiar O cabo Valério dos
                Santos Oliveira, de 36 anos, levou o tiro na
                cabeça quando pedia calma aos colegas. Há 29
                anos, seu pai, também policial, foi baleado por
                um colega e morreu. Valério é de uma família
                na qual a farda é tradição. Começou a
                trabalhar aos 6 anos, como flanelinha. Foi
                engraxate, office-boy e tapeceiro. Quando entrou
                na PM, tornou-se evangélico. Casado, dois
                filhos, hoje lidera o Grupo Familiar Cristão,
                com reuniões em sua casa | 
"Expulsamos a
        CUT" -- Inútil atribuir esse ânimo a
        infiltrações na corporação pelos oposicionistas de
        sempre. A greve dos PM mineiros não foi conduzida por
        um braço militar da CUT. Nasceu e foi conduzida pelo
        setor mais duro da tropa. O líder da rebelião, Júlio
        César Gomes, por exemplo, até dois meses atrás era
        comandante de uma unidade da Rotam, batalhão de elite da
        PM que é a cópia mineira da Rota paulista -- inclusive
        quanto ao uso de métodos bárbaros. O cabo Júlio esteve
        preso há dois meses sob acusação de ter-se excedido ao
        balear um homem acusado de tráfico. Há dois anos,
        participou de uma operação de repressão aos cortadores
        de cana em greve no sul do Estado. Em seu currículo
        entram também sessões de pancadaria contra
        metalúrgicos grevistas de Betim. O número 2 do comando
        da rebelião, o sargento Washington Rodrigues, é o
        policial mais temido na periferia de Belo Horizonte,
        porque a ele se atribuem mais de uma dezena de mortes.
        Rodrigues também é uma figura constante na repressão a
        passeatas. Em 1987, ele e Júlio estavam na tropa que
        impediu professores em greve de se aproximar da Praça da
        Liberdade -- exatamente o que eles mesmos fizeram na
        semana passada. "Foi por isso que expulsamos a CUT
        do nosso movimento. Amanhã teremos de reprimi-los e
        poderíamos ser cobrados", diz o cabo Júlio,
        pragmático. 
Em Minas, os PM têm orgulho de
        vestir a farda. São populares. Quando saíam em
        passeata, os policiais eram saudados por chuva de papel
        picado atirado do alto dos prédios e aplaudidos pelas
        pessoas da calçada. Segundo dados do Ministério da
        Justiça, todas as polícias militares dos Estados juntas
        formam uma tropa de 363.412 homens, o dobro do efetivo do
        Exército, que dispõe de 180.000 militares em todo o
        país. A PM de Minas é a segunda, com 42.000 homens. Só
        perde para a PM de São Paulo, com 79.228 militares. A PM
        do Rio vem em terceiro, com 27.932 homens. Segundo um
        levantamento da PM mineira, os melhores salários pagos a
        soldados da PM estão no Distrito Federal. A PM de Minas
        está entre as dez que pagam os menores salários a seus
        praças no Brasil.
A íntegra. 
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