Há muito sabemos que a PM é a força militar deixada pela ditadura para, na democracia, reprimir os movimentos populares e chacinar os pobres, diariamente; precisas ser reformadas para que tenhamos polícias realmente democráticas. É um dos entulhos autoritários que a "transição pacífica", que resultou da "distensão lenta, gradual e segura", nos deixou, fazendo com que o golpe de meia década atrás se tornasse historicamente vitorioso, pelos seus efeitos duradouros.
A ditadura está ainda em toda parte, basta olhar e constatar: na PM e na Globo, no Congresso e nas grades do Palácio da Liberdade... O que não foi democratizado, pelos governos "civis", desde 1985, seja na polícia ou na política, seja na comunicação ou nos espaços públicos, seja nas instituições ou no comportamento, é ainda obra da ditadura que conservamos no Brasil "democrático". A ditadura foi eficaz.
Neste artigo, Jânio de Freitas chama atenção para outra questão: também os militares das Forças Armadas -- que estão afastados da política há 29 anos, pela primeira vez na história brasileira, desde que lideraram a proclamação da República -- precisam ser formados para a democracia. Os militares brasileiros ainda são formados na ideologia da guerra fria, a serviço dos EUA.
Da Folha de S. Paulo, via blog Luís Nassif Online.
Nunca mais?
Jânio de Freitas
O cinquentenário de 64 mostra-se como um brado uníssono de "ditadura nunca mais". Talvez seja assim. Mas só poderá ser se consumadas duas condições.
O ensino das escolas militares precisaria passar por reformulação total. A do Exército, mais que todas. Nas escolas militares brasileiras não se ensinam apenas as matérias técnicas e acadêmicas apropriadas para os diferentes ramos da carreira militar. Muito acima desse ensino, as escolas militares ocupam-se de forjar mentalidades. Uniformes, planas, infensas à reflexão, e, por aí já está claro, ideológica e politicamente direcionadas. São produtos criados ainda para a Guerra Fria.
É por isso que se vê, há tantos anos, tão igual solidariedade e defesa dos atos e militares que, para a lei e para a democracia, são criminosos, muitos de crimes hediondos e de crimes contra a humanidade.
As escolas militares não preparam militares para a democracia.
Outra condição é que se propague a noção de soberania, tão escassa nos níveis socioeconômicos que influenciam a condução do país. Em seu artigo na Folha de ontem, o embaixador Rubens Ricupero contou de documentos por ele vistos, na Biblioteca Lyndon Johnson, em que os "reformistas" conduzidos por Roberto Campos, no governo Castello Branco, sujeitavam aos americanos até a revisão do currículo escolar. Se a imaginação conseguir projetar a mesma conduta para o sistema financeiro privado, por exemplo, pode-se ter uma ideia dos obstáculos que a construção do desenvolvimento brasileiro enfrenta.
A íntegra.