segunda-feira, 5 de dezembro de 2011
Domingo triste
Além da morte do Doutor Sócrates, a goleada inesperada para o Cruzeiro. A capacidade do Atlético de dar infelicidade aos seus torcedores parece infinita. Fomos nos acostumando a alegriazinhas, num nível cada vez mais baixo: a campanha de recuperação e o título da série B, um título estadual de vez em quando, séries de vitórias para escapar de novo rebaixamento, uma vitória espetacular sobre o rival... Mas alegria mesmo, duradoura, como tínhamos em outros tempos, isso acabou. Nosso Galo virou galinha morta, um time que apanha sem vergonha e cada grande vexame pode ser superado por um vexame ainda maior. Não estamos sozinhos nisso. O próprio rival dá exemplo de como um clube pode decair. A diferença é que o Cruzeiro é agora o que o Atlético já foi: o time da raça e da superação, capaz de renovar o orgulho do seu torcedor com uma vitória histórica sobre o rival aparentemente mais forte. Este é mais um sofrimento que nós, atleticanos, temos de aceitar, o de ter perdido a própria alma, imortalizada no hino: "jogamos com muita raça e amor, honramos o nome de Minas, lutar, lutar, lutar com toda nossa raça pra vencer". Talvez seja isso o mais difícil: hoje eu me identifico mais com a raça cruzeirense do que com o espírito mulher-de-malandro do ex-Galo. Se queremos nos alegrar com aquele espírito que caracterizava o Atlético, o certo é torcer para o Cruzeiro... Não estamos sozinhos, porém. Esta perda de identidade dos clubes de futebol brasileiro é uma característica contemporânea. Quando olho para os clubes das décadas de 60, 70 e até 80, vejo não apenas camisas, mas equipes vestindo-as. O Atlético era o time de Reinaldo, Cerezo, Luisinho, Marcelo, João Leite, entre outros. O Corinthians era o time de Sócrates, Casagrande, Wladimir, Biro-Biro. O Flamengo era o time de Zico, Adílio, Júnior, Andrade, Raul. E assim outros times de cujas escalações nos lembramos porque os jogadores se identificavam com o clube e porque permaneciam durante muitos anos neles. O Santos era o time de Pelé, Coutinho, Pepe, Zito, Gilmar... Quantos clubes existem assim hoje no Brasil? Talvez o próprio Santos apenas, que se esforça para manter Neymar e Ganso, depois de ter vivido a era Robinho-Diego. O exemplo só confirma o modelo, pois Neymar e Ganso são dois meninos e mantê-los por mais uma ou duas temporadas depois de formarem um verdadeiro time é já um feito, enquanto, em outros tempos, Pelé, o maior craque da História, jogou toda sua carreira pelo clube. Essa situação talvez mude novamente: no estrangeiro vemos clubes como o Barcelona, que tem identidade. No Brasil, porém, o futebol virou essa coisa esquisita, em que empresários são donos de jogadores e estes viraram mercadorias, mudando de clube para clube a cada temporada, sem amor à camisa, sem sequer chegarem a formar um time de verdade. Alguns clubes estão se dando melhor nesse modelo, talvez por competência administrativa, competência empresarial, melhor dizendo, pois dirigir um clube não é mais uma coisa que se faça com o coração, virou um negócio como qualquer outro. O Cruzeiro é uma empresa mais bem administrada do que o Atlético e obtém melhores resultados. Pode ser que o Galo ultrapasse essa fase e volte a vencer e conquistar títulos (com outro presidente, certamente, "profissional", porque as declarações do atual depois do jogo de ontem são de um torcedor, assim como fazer festa e pagar bicho pelo não rebaixamento revelam mentalidade medíocre). Mais difícil parece o futebol voltar ao que foi sua origem e o tornou tão importante na cultura nacional: a paixão dos torcedores e dos jogadores pelo seu clube do coração.