Uma reflexão sobre a continuação de 2011 -- um ano de mobilizações e revoltas -- em 2012. A questão se resume, de certa forma, ao fato de que a transformação interessa à imensa maioria da humanidade, mas não às lideranças, a minoria que detém o poder. Curiosamente, mesmo lideranças originalmente de esquerda passam para a direita quando chegam ao poder. Isso não é novidade, aconteceu, por exemplo, na virada do século XIX para o século XX, quando os social-democratas preferiram sustentar o Estado burguês a fazer a revolução socialista, que era a razão da sua existência. Os comunistas russos foram exceção, romperam com os "reformistas" e por isso a revolução aconteceu só no império russo, rebatizado de União das Repúblicas Socialistas Soviéticas. No século XXI não apenas não existe mais URSS, como são raros e sem importância os comunistas, como também não existem organizações revolucionárias internacionais. No entanto, os acontecimentos são cada vez mais internacionais e a transformação do capitalismo para uma outra civilização fica aí batendo na porta, em avisos de que essas crises econômicas e a acelerada destruição ambiental não vão nos levar a um lugar melhor do que o que temos hoje. Em 2011 essa consciência da necessidade de transformação do mundo e de que 1% (exagero: serão, se tanto, 0,01%) se beneficia de uma ordem que prejudica 99% tornou-se universal. A questão, portanto, é: quem vai mudar o mundo e como? O sociólogo americano Immanuel Wallerstein, autor do artigo abaixo, tem 81 anos e  acredita que o capitalismo chegou ao fim da linha, mas o que  surgirá em seu lugar pode ser melhor (mais igualitário e democrático) ou  pior (mais polarizado e explorador) do que o que temos hoje.
Do saite Outras Palavras.
A esquerda mundial após 2011
Por Immanuel Wallerstein | Tradução: Daniela Frabasile
Por qualquer ângulo, 2011 foi um bom ano para a esquerda mundial –  seja qual for a abrangência da definição de cada um sobre a esquerda  mundial. A razão fundamental foi a condição econômica negativa, que  atinge a maior parte do mundo. O desemprego, que era alto, cresceu ainda  mais. A maioria dos governos enfrentou grandes dívidas e receita  reduzida. A resposta deles foi tentar impor medidas de austeridade  contra suas populações, ao mesmo tempo em que tentavam proteger os  bancos. O resultado disso foi uma revolta global daquilo que o movimento  Occuppy Wall Street chama de "os 99%". Os alvos eram a excessiva  polarização da riqueza, os governos corruptos, e a natureza  essencialmente antidemocrática desses governos — tenham eles sistemas  multipartidários ou não. O Occuppy Wall Street, a Primavera Árabe e os Indignados não  alcançaram tudo o que esperavam. Mas sim conseguiram alterar o discurso  mundial, levando-o para longe dos mantras ideológicos do neoliberalismo —  para temas como desigualdade, injustiça e descolonização. Pela primeira  vez em muito tempo, pessoas comuns passaram a discutir a natureza do  sistema no qual vivem. Já não o veem como natural ou inevitável… A questão para a esquerda mundial, agora, é como avançar e converter o  sucesso do discurso inicial em transformação política. O problema pode  ser exposto de maneira muito simples. Ainda que exista, em termos  econômicos, um abismo claro e crescente entre um grupo muito pequeno (o  1%) e outro muito grande (os 99%), a divisão política não segue o mesmo  padrão. Em todo o mundo, as forças do centro-direita ainda comandam  aproximadamente metade da população mundial, ou pelo menos daqueles que  são politicamente ativos de alguma forma. Portanto, para transformar o mundo, a esquerda mundial precisará de  um grau de unidade política que ainda não tem. Há profundos desacordos  tanto sobre a objetivos de longo prazo quanto sobre táticas a curto  prazo. Não é que esses problemas não estejam sendo debatidos. Ao  contrário, são discutidos acaloradamente, e pouco progresso tem sido  feito para superar essas divisões. Essas discordâncias são antigas. Isso não as torna fáceis de  resolver. Existem duas grandes divisões. A primeira é em relação a  eleições. Não existem duas, mas três posições a respeito. Existe um  grupo que suspeita profundamente de eleições, argumentando que  participar delas não é apenas politicamente ineficaz, mas reforça a  legitimidade do sistema mundial existente. Os outros acham que é crucial participar de processos eleitorais. Mas  esse grupo está dividido em dois. Por um lado, existem aqueles que  afirmam ser pragmáticos. Eles querem trabalhar de dentro – dentro dos  maiores partidos de centro-esquerda quando existe um sistema  multipartidário funcional, ou dentro do partido único quando a  alternância parlamentar não é permitida. E existem, é claro, os que condenam essa política de escolher o mal  menor. Eles insistem que não existe diferença significativa entre os  principais partidos e são a favor de votar em algum que esteja "genuinamente" na esquerda. Todos estamos familiarizados com esse debate e já ouvimos os  argumentos várias vezes.
A íntegra.
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