domingo, 8 de janeiro de 2012

Preocupação do brasileiro com segurança é medo da polícia

Pesquisas indicam que segurança é uma das maiores preocupação dos brasileiros. A velha imprensa dá a conotação de que a população se sente ameaçada pela violência, que é preciso aumentar o policiamento e os equipamentos de vigilância, como câmaras de monitoramento, quando na verdade se trata do oposto: a população tem medo é da polícia. (O elevado número de leituras deste post, com comentários, o que é raro, me leva a esclarecer logo de saída que não critico pessoas, mas instituições, e que minha motivação não é disseminar ódios, mas, como sempre, pensar numa cidade, num país e num mundo melhores. Em 11/1/12.) A polícia brasileira gera insegurança na população porque trabalha para os ricos e poderosos, não para o cidadão comum que paga impostos e a quem ela deveria servir. Além desse papel institucional, que se manifesta na repressão violenta aos movimentos populares (paralelamente a funções necessárias e louváveis, como os bombeiros e outras formas de prestação de serviço), a polícia brasileira é autoritária no dia a dia. O cidadão comum tem medo da polícia, identifica-a com os bandidos e sabe que ela não está aí para corrigir injustiças e proteger os mais fracos, mas para intimidá-los e manter a ordem para os mais fortes (não os policiais individualmente, mas as políticas policiais implantadas por governos). Exemplo disso é o relato abaixo, de um professor universitário, que pode ser multiplicado aos milhares, aos milhões. Aconteceu em São Paulo, mas acontece em Minas e em todos os estados, em maior ou menor grau. Todo brasileiro tem histórias similares para contar e que ajudaram a formar seu comportamento diante da polícia: fingir que não está vendo arbitrariedades contra pobres e negros, falar com policiais como se eles fossem Deus e nós humildes pecadores, não chamar a polícia quando acontece algum crime, porque o problema vai é aumentar, transformar em piada e brincadeira uma manifestação de prepotência ou racismo, ficar amigo de policiais para resolver eventuais problemas com "jeitinho", e coisas assim. Durante a ditadura militar, quando a PM era força auxiliar do Exército e a polícia civil emprestava quadros e instalações para a tortura, isso era compreensível, mas o que justifica que as polícias brasileiras continuem truculentas, corruptas e acima da lei em 2012, depois de 27 anos de "democracia", no décimo ano do governo do PT?! Nunca tivemos tanta polícia e ao mesmo tempo tanta "insegurança": as novas guardas municipais, que poderiam ser exemplo de uma força policial da democracia, seguindo novos valores, comportanto-se de forma educada e atenciosa, a serviço da população, só vieram aumentar o mesmo quadro de ineficiência e autoritarismo. Afinal, quem as treina? A PM. Se algum dia houver uma revolta popular no Brasil como as que se veem em muitos países do mundo, ela vai começar assim, como a explosão contra a violência permanente da polícia.

PS: O comentário a este post publicado abaixo reforça a própria notícia e é mais um exemplo dessa prepotência policial. O comentarista poderia, é claro, discordar e argumentar. Em vez disso tenta intimidar.

PS2: Outro comentário, sem a mesma intimidação, mas igualmente sem argumentação. A polícia brasileira não pode ser criticada? Esta acima do cidadão?

PS3: Mais um comentário carregado de intolerância e preconceito, mas dessa vez, aparentemente, vindo da esquerda. Basta uma espiada no blog (e até mesmo a leitura atenta deste post) para ver que contém críticas ao governo Dilma, embora saiba distinguir entre ele e governos de direita, piores.

PS4: Um quarto comentário equilibra melhor as opiniões.


Do Portal Galadés.
Relato sobre violência policial em Campinas
4 janeiro 2012
Por Henrique Pereira Monteiro
Professor, doutorando em Filosofia pela FFLCH-USP.
Ao longo do ano passado, o bairro em que moro no distrito de Barão Geraldo, em Campinas, esteve sob presença constante da Polícia Militar. Não demorou para eu e minha companheira Georgia Sarris começarmos a presenciar formas de abuso de autoridade, como abordagens humilhantes de adolescentes. Moramos perto de uma praça que é um dos pontos centrais de tais ações, cujo viés racial e de classe é conhecido. A repetição dos casos começou a nos preocupar. Com o intuito de mostrar a presença de moradores que não se conformariam com abusos, fui até os policiais durante uma batida no final de agosto. Apresentei-me educadamente, perguntei do que se tratava e disse que ia permanecer no local para verificar se tudo iria transcorrer tranquilamente. Tal atitude, a de um simples cidadão comum observando os procedimentos de um agente público, algo que deveria ser banal em qualquer regime democrático, gerou imediatamente um turbilhão inacreditável de agressividade. Foi o bastante para que eu fosse intimidado de várias formas ao longo de mais de duas horas, com ameaças de prisão (ilegal) por não portar documento de identidade, por desacato, entre outros exemplos. Deixei claro que estava disposto a denunciar abusos e fiz críticas à estrutura autoritária da PM, mas sempre tratei os policiais da forma mais respeitosa possível. Entretanto, a questão não era de mais ou menos polidez. O problema, na verdade, é que, ao questionar diretamente a PM, atravessei uma fronteira social muito precisa: assim como os jovens pobres que frequentam (ou tentam frequentar) as praças de Barão Geraldo, eu já havia deixado de ser cidadão e me tornado um inimigo. Depois disso, começou um processo de intimidação pessoal discreta, mas clara. Viaturas passando muito vagarosamente na minha porta, em frente à minha mesa no restaurante, faroletes na minha janela à noite, policiais me encarando em vários lugares do bairro etc. Houve outra batida, em frente à minha casa, que era nitidamente uma provocação, com um policial de braços cruzados, peito estufado, pernas abertas bem diante do meu portão. É claro que não fui lá. No dia 29 de dezembro passado, nova batida na praça, desta vez envolvendo um vizinho. Não pude deixar de ir até o local, inclusive para apoiar minha vizinha, companheira de um dos rapazes detidos, que observava à distância. Quando os policiais disseram que iriam levá-los, nós nos aproximamos. Comecei a fazer as perguntas básicas: "Para onde serão levados? Sob qual acusação?" De novo, fui cercado por vários policiais e intimidado de forma truculenta. Provocações variadas se seguiram até que um dos policiais forçou a minha prisão, completamente arbitrária, por "desacato à autoridade". Mesmo depois, provocações e ameaças não pararam. O interesse pessoal que tenho em divulgar esta história – preservar a minha segurança e a de minha companheira – já aponta também o seu evidente interesse público. A violência que sofri – até agora – é ínfima para os padrões de ação da Polícia Militar do Estado de São Paulo, como sabem os jovens das periferias, os militantes de movimentos sociais, os ativistas de direitos humanos. No entanto, ela é da mesma natureza e também serve como documento, ainda que em escala reduzida, de processos sociais que nos afetam a todos e devem ser combatidos. Quando se trata da higienização social das cidades, da criminalização do protesto, da expansão do autoritarismo e da policialização generalizada das relações sociais, nenhuma "escala" é pequena o bastante para ser desprezada.